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26 de Abril de 2024
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    Lote de tamanho inferior ao fixado em lei não pode ter escritura

    Publicado por Expresso da Notícia
    há 16 anos

    Não é possível o pedido de outorga da escritura pública de um lote de 1.800 m² no Lago Sul, em Brasília, já que o contrato de compra e venda celebrado entre C.M.R. e M.V.T.B. não é válido, pois a compra da fração ocorreu quando o imóvel era indivisível, portanto, o ato é ilícito. O entendimento foi firmado pela Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) ao julgar o recurso do comprador contra a proprietária do lote.

    A Turma manteve a decisão de segunda instância que julgou extinto o processo, por entender que, mesmo com a aprovação da Lei Complementar Distrital 129 /98 (que trata sobre a edificação de condomínios por unidades autônomas), o contrato continuou ilícito. A metragem mínima de 2.500m² não foi observada, visto que a fração adquirida possui apenas 1.800m².

    O comprador ajuizou ação de cumprimento de obrigação de fazer contra a proprietária. Ele tinha adquirido um sexto de um terreno de aproximadamente 10 mil m² no Lago Sul. O pagamento do terreno foi estipulado em R$ 210 mil, sendo que, no fechamento do negócio, foi paga a importância de R$ 100 mil, ficando acertado que, quando houvesse a quitação do restante (R$ 110 mil), a dona do terreno outorgaria a escritura definitiva do imóvel. Em decorrência do descumprimento do acordo, ele ajuizou ação de cumprimento de obrigação de fazer.

    Entre agosto e novembro de 1997, o comprador pagou o restante da quantia, mas a proprietária não cumpriu com suas obrigações quanto à escritura definitiva do imóvel. Segundo ele, a proprietária ainda omitiu a informação de que não existia a carta de habite-se. Essa carta só foi expedida em julho de 2000.

    Em 1998, foi aprovada a Lei Complementar Distrital 129 , que estabeleceu o parcelamento da área em lotes autônomos de 2.500m². Em decorrência desse fato novo, a proprietária do terreno ofereceu ao comprador outros 700m² para completar a área de parcelamento ao pagamento de R$ 80 mil. A proposta não foi aceita, portanto a outorga da escritura não foi feita.

    Em primeira instância, o pedido do comprador foi julgado procedente, sendo a proprietária condenada a promover a outorga da escritura pública da venda de um sexto do imóvel objeto do contrato particular celebrado.

    A sentença foi reformada para julgar extinto o processo sem julgamento de mérito. Para o Tribunal, verifica-se a impossibilidade jurídica do pedido de obrigação de fazer, tendo em vista a ilicitude do objeto do contrato de compra e venda realizado entre as partes.

    Inconformado, o comprador recorreu ao STJ, argumentando que a decisão viola artigos do Código Civil e alegando que cada um dos credores solidários tem direito a exigir do devedor o cumprimento da prestação por inteiro.

    Ao analisar a questão, o relator, ministro Ari Pargendler, destacou que o tema discutido nesse processo é um caso de impossibilidade jurídica. Para o ministro, o comprador poderia ter interposto recurso especial com a finalidade de que fosse reconhecido o julgamento do mérito da causa, a modo de dar pretexto à oposição de embargos (tipo de recurso). Em vez disso, ele pediu a reforma do julgado.

    Processo REsp nº 909.968

    Leia, abaixo, a íntegra da decisão:

    "RECURSO ESPECIAL Nº 909.968 - DF (2006⁄0274168-7)

    RELATOR : MINISTRO ARI PARGENDLER

    RECORRENTE : CAIO MARIO RENAULT

    ADVOGADO : THIAGO PEDROSA FIGUEIREDO E OUTRO (S)

    RECORRIDO : MARIA VERA TEIXEIRA BRANT

    ADVOGADA : JANINE MALTA MASSUDA E OUTRO (S)

    EMENTA

    1. PROCESSO CIVIL. POSSIBILIDADE JURÍDICA DO PEDIDO E MÉRITO. Recurso especial interposto contra acórdão que, por maioria de votos, julgou extinto o processo sem julgamento de mérito à conta do que chamou de impossibilidade jurídica do pedido, aplicando combinadamente o art. 267 , inc. I e o art. 295 , parágrafo único , inc. III , do Código de Processo Civil . A impossibilidade jurídica de que tratam as aludidas normas legais é aquela aberrante, identificada a primo oculi. Quando esse não é o caso, o acórdão enfrenta o mérito da lide, e está sujeito a embargos infringentes sempre que houver divergência. Não obstante presentes todas essas circunstâncias na espécie, o acórdão deixou de ser atacado quanto à modalidade de extinção do processo (sem o exame do mérito), de modo que não há como obstar o julgamento do recurso especial. 2. AÇÃO PROPOSTA PELO ADQUIRENTE, VISANDO A OUTORGA DE ESCRITURA PÚBLICA DE COMPRA E VENDA DE FRAÇÃO IDEAL DE IMÓVEL QUE, À ÉPOCA DO AJUIZAMENTO, JÁ ESTAVA DESMEMBRADO EM OUTROS. Statu quo ante que não pode ser restabelecido sem a anulação do ato que dividiu o imóvel originário. Recurso especial não conhecido.

    ACÓRDÃO

    Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indicadas, acordam os Ministros da TERCEIRA TURMA do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, não conhecer do recurso especial nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros Massami Uyeda e Sidnei Beneti votaram com o Sr. Ministro Relator. Impedida a Sra. Ministra Nancy Andrighi. Ausente, justificadamente, a Sra. Ministra Nancy Andrighi. Pelo recorrente: Dr. Paulo Roberto Roque. Pela recorrida: Dr. Fernando Neves da Silva

    Brasília, 08 de abril de 2008 (data do julgamento).

    MINISTRO ARI PARGENDLER

    Relator

    RECURSO ESPECIAL Nº 909.968 - DF (2006⁄0274168-7)

    RELATÓRIO

    EXMO. SR. MINISTRO. ARI PARGENDLER (Relator):

    Caio Mario Renault propôs 'ação de cumprimento de obrigação de fazer com pedido de tutela antecipada' contra Maria Vera Teixeira Brant, relatando os seguintes fatos:

    “Em 10.07.97, o Autor comprou da Ré 1⁄6 (um sexto) do lote de nº 02, chácara 06, do SHI⁄Sul, com área de 10.756,00 m2, no qual já constava uma casa de hóspedes, localizada na SHIS, QI 19, chácara 03, nesta cidade.

    Quanto ao pagamento, foi estipulado o valor total de R$

    (duzentos e dez mil reais), sendo que no ato da avença foi pago a importância de R$

    (cem mil reais), e quando o valor remanescente fosse pago, isto, R$

    (cento e dez mil reais), a Ré outorgaria a escritura definitiva do imóvel.

    O valor de R$

    (cento e dez mil reais) foi pago no período de 12.08.97 a 14.11.97, conforme comprovam os recibos em anexo. Não obstante o pagamento integral do valor avençado, a Ré não cumpriu com a sua obrigação, qual seja, não outorgou a escritura definitiva do imóvel, tal como se verifica na certidão atualizada do imóvel. Omitindo, ainda, a informação de que não havia a competente Carta de Habite-se, vindo a ser expedida tão-somente em 19.07.00.

    A inadimplência da Ré até o presente momento tem impedido que o Autor exerça os direitos oriundos da propriedade, já que não pode usar, fruir e dispor da coisa como poderia e deveria. Estando, então, a Ré em mora desde 14.11.97, época em que deveria ter outorgado a escritura do imóvel, tal como acordado.

    Aliado a esse fato, é inegável também a insegurança que reveste o Autor, pois desde 1997 pagou o valor total de um imóvel e até hoje o bem ainda não está registrado em seu nome. Em decorrência desse fato, o Autor pode, a qualquer momento, ser surpreendido com uma repentina e maliciosa venda do único imóvel residencial por ele adquirido, já que a Ré se recusa, veementemente, a outorgar-lhe escritura definitiva do imóvel.

    Não há como negar que o receio do Autor quanto a possibilidade de a Ré alienar, a qualquer tempo, o único bem residencial por ele adquirido causa transtornos de ordem moral. Isto porque, a própria Ré procedeu a divisão, demarcação e instituição do condomínio da área, em 3 (três) unidades autônomas, quais sejam: Unidade A, Unidade B e Unidade C, sem que o Autor fosse sequer consultado. Ato contínuo, o Memorial Descritivo foi registrado. Fatos esses que têm proporcionado ao autor insegurança significativa e abalos morais.

    O Autor tem motivos para preocupar-se com uma eventual alienação à sua revelia, pois, tal como se verifica no doc. em anexo, a Ré deu em garantia a Unidade A para garantir um empréstimo no valor de R$ 700.000,00 (setecentos mil reais).

    Importante destacar que a fração adquirida pelo Autor encontra-se descrita dentro da Unidade B e sobre esta unidade não recai, até o presente momento, nenhum ônus.

    No entanto, o fato de outra Unidade ter sido dada em garantia, não atenua a ansiedade e o medo do Autor, já que este não tem nenhuma garantia de que o lote por ele adquirido não será alienado ou dado em garantia, pois todo o imóvel está registrado em nome, tão-somente, da Ré.

    Veja Exa. que a Ré vendeu o imóvel com 1.800 m2 e, quando da constituição do condomínio, dividiu (um mil e oitocentos metros quadrados) o lote em partes autônomas com 2.500 m2 cada. Em razão da diferença entre a metragem do imóvel objeto da avença e o da constituição do condomínio, a Ré tem exigido que o Autor pague o valor de R$

    (oitenta mil reais) referente aos 700,00 m2 (setecentos metros quadrados) para outorgar-lhe a escritura” (fl. 16, o negrito é do texto original).

    Foram estes os pedidos:

    - “... seja determinado à Ré que outorgue a escritura definitiva da fração do imóvel adquirido pelo Autor, tornando-se condômino do imóvel, sob pena de aplicação de multa cominatória (astreintes) a partir da contestação, nos termos do art. 461, § 4º, do CPC” (fl. 25);

    - “... sucessivamente, caso esse juízo entenda que não seja possível a outorga da escritura da fração adquirida equivalente a

    (um mil e oitocentos metros quadrados), que seja declarada nula a divisão, especificação e constituição do condomínio, bem como de todos os atos dele decorrentes, e seja assegurada ao requerente a escritura definitiva relativa aos mil e oitocentos metros quadrados, alienados pela requerida” (fl. 26);

    - “... a condenação da Ré ao pagamento de danos morais suportados pelo Autor, fixados por esse juízo” (fl. 26).

    A resposta deu outra versão para os fatos:

    “As partes assinaram uma promessa de compra e venda da parte ideal de 1⁄6 (um sexto) do imóvel constituído pelo lote nº 2 do CH 06 do SHI⁄Sul, antiga denominação da Chácara 3 da QI 19.

    Como as partes sabiam que não seria possível registrar a venda e compra de parte específica do imóvel, indivisível por disposição legal ( art. 25 da Lei 2.874 , de 1956, e art. 4º da Lei 5.861 , de 1972 ), fizeram constar do instrumento, entre outras avenças, o seguinte:

    'IV) que, independentemente dos termos da referida escritura de compra e venda, que se restringirão à referência específica daquela parte de 1⁄6 do imóvel, em virtude da inexistência de registro de instituição de condomínio no cartório imobiliário retrocitado, fica estipulado entre as partes contratantes o seguinte:

    a) à promitente vendedora ficarão pertencendo a casa principal e a parte do terreno onde a mesma se encontra fincada, entendida esta como a área equivalente a 5⁄6 (cinco sextos) do total da área do lote;

    b) ao promitente comprador ficarão pertencendo a casa de hóspede e a parte do terreno onde a mesma se encontra fincada, limitando-se esta à área equivalente a 1⁄6 (um sexto) da área do lote'.

    Ou seja, as partes explicitaram que tinham ciência da impossibilidade de registro do negócio tal como acertado e definiram a área que caberia a cada um.

    .........................................................

    Um ano depois, em agosto de 1998, foi editada a Lei Complementar nº 129 , do Distrito Federal, autorizando a edificação de condomínios por unidades autônomas em diversos setores, entre eles o de Chácaras do SHI⁄Sul.

    A ré resolveu dividir seu terreno, inclusive para facilitar a regularização do negócio feito com o autor. Só que como a norma estabelecia uma área mínima de dois mil e quinhentos metros, não conseguiu fazer com que uma das partes desmembradas correspondesse exatamente a um sexto do total do terreno.

    Por isso, a parte que continha a casa de hóspede vendida ao autor acabou ficando com dois mil e quinhentos metros quadrados, ou seja, bem mais do que os mil e oitocentos metros quadrados ou um sexto do terreno total, por ele adquirido.

    O autor participou, intensamente, do fracionamento da chácara, opinando e decidindo sobre a melhor localização e dos limites das frações que se criavam, tudo sob a supervisão e responsabilidade da engenheira Elvira.

    Mas permanecia a impossibilidade do registro da escritura no Cartório de Imóveis. O problema continuava, mas agora com solução mais fácil: bastava o autor comprar mais setecentos metros quadrados que ficaria com toda a fração 'B' e a escritura poderia ser prontamente outorgada e registrada.

    Essa proposta foi feita ao autor, que a recusou alegando falta de recursos. A ré disse que aceitaria postergar o pagamento dessa aquisição, que seria garantida por nota promissória. O agravado (sic) também não aceitou. A ré propôs, então, transferir a fração 'B' para o autor e para um sobrinho seu, de acordo com as aquisições feitas por cada um. Novamente o autor preferiu aguardar, silenciando” (fl. 81⁄84, o negrito é do texto original).

    O MM. Juiz de Direito Dr. Marcelo Andrés Tocci julgou:

    - procedente o pedido principal, condenando Maria Vera Teixeira Brant “... a promover, no prazo de 30 (trinta) dias a contar da intimação da presente decisão, a outorga da escritura pública de venda de 1⁄6 (um sexto) do imóvel objeto do contrato particular entre eles celebrado, sob pena de multa diária que fixo em R$ 100,00 (cem reais), em ocorrendo descumprimento e que passará a incidir após o lapso concedido, desde já limitada ao montante de R$

    (três mil reais), caso em que, permanecendo a inércia da parte, valerá a presente decisão como título hábil perante o Registro de Imóveis” (fl. 161).

    - e improcedente o pedido secundário, de indenização de danos morais (fl. 161).

    Lê-se na sentença:

    “Do contexto delimitado pelas partes é possível depreender-se, por ser matéria incontroversa, que ambos firmaram, em 10 de julho de 1997, instrumento particular de promessa de compra e venda, tendo como objeto a fração ideal de 1⁄6 (um sexto) do imóvel descrito na inicial, pelo preço de R$ 210.000,00 (duzentos e dez mil reais)...

    .........................................................

    Da mesma forma, por ausência de impugnação, constata-se que o preço contratado foi integralmente satisfeito pelo promitente comprador, mediante a quitação, no ato da celebração, da quantia de R$

    (cem mil reais) e o restante, em quatro prestações, respectivamente nos valores de R$

    (quarenta e cinco mil reais), R$

    (sete mil e quinhentos reais), R$

    (dezoito mil e quinhentos reais) e R$

    (trinta e nove mil reais), pagas entre os dias 12 de agosto e 14 de novembro de 1997, inclusive, consoante fazem prova os recibos acostados às fl. 17 a 20.

    Logo, na forma ajustada pelas partes, caberia à demandada, por ocasião do recebimento da última parcela contratada, promover a escrituração da transferência da fração ideal adquirida pelo requerente, correspondente à sexta parte da área total do terreno, independentemente de qualquer outra condição ou termo e assim, por não ter ela implementado sua obrigação, incorreu, desde então, em mora, pois, diversamente do apontado em sua defesa, inexistiu qualquer obstáculo ao correspondente adimplemento.

    Ocorre que a negociação realizada relativamente à parte ideal do imóvel, ao ser devidamente transcrita no registro competente, implicará na formação de condomínio entre as partes, na proporção de 1⁄6 (um sexto) para o autor e 5⁄6 (cinco sextos) para a demandada, o que é admitido pelo ordenamento pátrio, pouco importando se, na época da celebração da promessa de compra e venda, existia expressa proibição legal ao fracionamento, visto que, nesta hipótese, incidiria a comunhão sobre coisa indivisa, ou seja, relativamente a toda a área da chácara.

    .........................................................

    Tal situação sequer foi alterada após a edição da Lei Complementar Distrital 128⁄98 , que possibilitou aos proprietários de imóveis localizados na área que indica a divisão do solo em frações autônomas, desde que, cada uma contasse com área mínima de 2.500 m2.

    .........................................................

    A despeito da faculdade concedida à ré pela legislação distrital, devidamente exercida, conforme demonstram o instrumento particular de divisão, especificação e instituição de condomínio (fl. 25 a 27) e o posterior registro na matrícula do bem (fl. 21 a 24), assiste ao requerente o direito de participar, na proporção que lhe foi alienada, como condômino do imóvel, assim, considerada sua área total e não de apenas sobre uma das unidades que foram geradas, pois, como já indicado, trata-se de parte ideal, não individualizada.

    Mesmo a previsão contida no instrumento particular de promessa de compra e venda que constitui o objeto da demanda, a respeito da especificação da área que caberia ao comprador, não possui o condão de tornar o bem que, à época da contratação era juridicamente indivisível, em diviso, somente podendo ser considerada, a descrição, como mero esboço à futura extinção do condomínio que porventura venha a ocorrer.

    .........................................................

    É certo que a área ideal cabível ao autor corresponde a aproximadamente 1.792 m2 (um mil, setecentos e noventa e dois metros quadrados), bem menor, portanto, à área da unidade 'B' que atualmente ocupa e que possui 2.580 m2 (dois mil, quinhentos e oitenta metros quadrados), conforme registrado na escritura de fl. 22 e, desta forma, caso pretenda exercer, com exclusividade, a propriedade sobre parcela individualizada do terreno, deverá adquirir a área faltante, tal como indicado pela ré em sua contestação, visando posterior escrituração, que deverá se seguir à extinção do condomínio, por ato amigável ou judicial, pois, até que isto ocorra, permanecerá como co-proprietário de 1⁄6 (um sexto) do imóvel” (fl. 151⁄155).

    O tribunal a quo, relatora a Desembargadora Vera Andrighi, reformou a sentença, por maioria de votos, destacando-se no acórdão os seguintes trechos:

    “Do exame da pretensão em cotejo com a legislação pertinente, verifica-se a impossibilidade jurídica do pedido de obrigação de fazer, tendo em vista a ilicitude do objeto do contrato de compra e venda realizado entre as partes (fl. 16), uma vez que contrário à lei.

    Na época da realização do contrato firmado entre as partes, o terreno principal era indivisível, conforme parágrafo único do art. da Lei 5.861 ⁄72 . Depois do advento da Lei Complementar 129 de agosto de 1998, foi autorizado o parcelamento dos terrenos, dispondo, contudo, que a área mínima de cada lote seria de 2.500 metros quadrados...

    Portanto, com razão a apelante-ré, quando afirma que é impossível o pedido de outorga da escritura pública, porque contrário à lei, na forma do contratado. Ademais, as disposições do Código Civil relativas ao condomínio voluntário são aplicáveis apenas à co-propriedade regular, isto, constituída mediante permissão legal e inscrita no competente registro de imóveis. Repise-se, a compra da fração ocorreu quando o imóvel era indivisível, portanto ilícito. Com o advento da Lei Complementar Distrital 129, continuou padecendo de ilicitude, porque o módulo mínimo de 2.500 m2 não foi observado, visto que a fração adquirida possui apenas 1.800 m2.

    .........................................................

    O autor formula pedido sucessivo: 'que seja declarada nula a divisão, especificação e constituição do condomínio, bem como todos os atos dele decorrentes, e seja assegurada ao requerente a escritura definitiva relativa aos mil e oitocentos metros quadrados, alienados pela requerida' (fl. 14).

    Todavia, tal pedido não foi analisado pelo MM. Juiz, porquanto acolheu o anterior. Reconhecida a carência de ação quanto ao primeiro, devem ser devolvidos ao Juízo a quo o exame desse pedido sucessivo, caso contrário, estar-se-ia suprimindo uma instância julgadora, o que é vedado pelo ordenamento jurídico vigente.

    .........................................................

    Isto posto, conheço das apelações, dou provimento à interposta por Maria Vera Teixeira Brant, para acolher a preliminar de impossibilidade jurídica do pedido anterior e, em relação a ele, julgo extinto o processo nos termos dos arts. 267, inc. I, cumulado com o 295, parágrafo único, inc. III, ambos do CPC . Em relação ao pedido sucessivo, determino a devolução dos autos ao Juízo a quo para análise das condições da ação quanto a ele e para o respectivo julgamento” (fl. 297⁄300).

    Caio Mário Renault interpôs o presente recurso especial, dizendo violados os arts. 267, I, e 295 , parágrafo único , inc. III , os arts. 82 , 145 e 623 do Código Civil e o art. , parágrafo único , da Lei nº 5.861 , de 1972 , bem como ocorrente divergência jurisprudencial (fl. 310⁄322).

    Contra-razões (fl. 335⁄348).

    RECURSO ESPECIAL Nº 909.968 - DF (2006⁄0274168-7)

    VOTO

    EXMO. SR. MINISTRO. ARI PARGENDLER (Relator):

    Letra “a”

    1. O presente recurso especial tem uma peculiaridade interessante, a de que foi interposto contra acórdão proferido por maioria de votos, porque o tribunal a quo julgou extinto o processo sem julgamento de mérito à conta do que chamou de impossibilidade jurídica do pedido, aplicando combinadamente o art. 267, inc. I, e o art. 295 , parágrafo único , inc. III , do Código de Processo Civil .

    A impossibilidade jurídica do pedido foi embutida no Código de Processo Civil por inspiração de Liebman. Antes mesmo da reforma do nosso ordenamento processual, aquele eminente jurista reconheceu o equívoco da noção, porque identificada com o mérito da causa (Manuale di Diritto Processuale Civile, Milano – Dott. A. Giuffrè Editore – 1973 – Terza Edizione, p. 120⁄125).

    Não obstante isso, a impossibilidade jurídica permaneceu no Código de Processo Civil como uma das condições da ação. A impossibilidade jurídica a que se reportava o mestre italiano era aquela identificada a primo oculi. À época do advento do Código de Processo Civil , a doutrina brasileira exemplicava-a com exemplos aberrantes, v.g., a ação de divórcio, inexistente então no nosso ordenamento jurídico.

    O tema controvertido neste processo não é um caso de impossibilidade jurídica evidenciado ao primeiro olhar. A despeito disso, isto é, decidindo o mérito da lide, o tribunal a quo julgou extinto o processo sem julgamento de mérito.

    Quid ?

    O autor poderia ter interposto o recurso especial com a finalidade de que, reconhecida a afronta ao art. 267 do Código de Processo Civil , fosse reconhecido o julgamento do mérito da causa, a modo de dar ensejo à oposição de embargos infringentes.

    Ao revés disso, dizendo embora violada aquela norma legal, as razões do recurso especial emprestaram-lhe uma conotação de mérito, pedindo a reforma do julgado, “vez que o objeto da transação celebrada pelas partes não é ilícito, sendo plenamente possível o pedido para outorga de escritura ao Recorrente, na forma de co-propriedade” (fl. 319).

    Sob esse viés, não é possível reconhecer a violação do art. 267 do Código de Processo Civil , e – aceito pelas partes que o julgamento foi realizado sem o julgamento de mérito – não há como obstar o exame do recurso especial.

    2. Padece ele, no entanto, do modo como foi articulada a ação. Se o propósito desta era o de assegurar ao autor o condomínio sobre 1⁄6 (um sexto) do imóvel originário, o ato que o dividiu supervenientemente deveria ter sido objeto do pedido principal. À data do ajuizamento, o cenário jurídico contemporâneo ao negócio firmado entre as partes já não existia. O imóvel estava desmembrado em três outros, com matrículas próprias no Ofício Imobiliário. Mais do que isso, sobre um deles pesava hipoteca em favor de terceiro. Nessas condições, sem a anulação do desmembramento e do aludido gravame, bem assim de outros negócios que eventualmente tenham versado sobre o imóvel originário, o statu quo ante não pode ser restabelecido. O tema só subsiste como pedido sucessivo (fl. 26, alínea d), cujo exame o tribunal a quo devolveu ao primeiro grau de jurisdição (fl. 300) – e está aparentemente prejudicado, porque sem a citação dos litisconsortes necessários (aquele favorecido pela hipoteca e outros que possam ter adquirido os lotes restantes) a relação processual, no tópico, não se completou.

    3. Obiter dictum, a indivisibilidade de um imóvel não inibe o respectivo condomínio. Por exemplo, se o titular da propriedade, não tendo outros bens, vem a falecer, os herdeiros sucedem-no em condomínio, persistindo a indivisibilidade do imóvel.

    Quando, porém, e disso se trata no caso, a transmissão de fração ideal é feita com o propósito de dividir o imóvel ao arrepio da lei de posturas, o condomínio se revela incompatível com a previsão legal de indivisibilidade, caracterizando manifesta fraude à lei.

    A esse propósito, a Turma tem um precedente de minha relatoria, aquele de que trata o RMS nº 9.876 , SP, cuja ementa vai a seguir reproduzida em parte:

    “CIVIL. VENDA DE FRAÇÃO IDEAL DE TERRAS, PARA TRANSFERIR LOTE CERTO E DETERMINADO, SEM O REGULAR PARCELAMENTO DO SOLO. IMPOSSIBILIDADE. A venda de fração ideal de terras parceladas irregularmente não pode ser objeto de registro imobiliário, porque frauda a legislação específica” (DJ, 18.10.99).

    Aqui ambas as partes fraudaram a lei, tal como deflui do acórdão proferido pelo tribunal a quo:

    “... da cláusula IV, 'd' (fl. 16), apreende-se que trataram como se o imóvel fosse divisível e as partes fracionadas fossem alienáveis separadamente” (fl. 298).

    Letra “c”

    Seja pelo anacronismo do pedido principal (que desconsiderou o desmembramento do imóvel originário), seja pela fraude à lei (alienação de parte localizada de um imóvel indivisível), o acórdão proferido pelo Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul na Apelação Cível nº 70004159166, relator o Desembargador José Francisco Pellegrini, não serve como paradigma.

    Lá o tabelião se recusara a lavrar escritura pública de compra e venda de fração ideal de um imóvel, “adquirida mediante cessão de direitos” (fl. 326), tendo esta sido realizada “em período anterior” (fl. 327) ao ato normativo da corregedoria que instituíra a restrição, e o que importa, nada se disse a respeito de as partes terem contratado a transmissão de parte individuada do imóvel.

    Voto, por isso, no sentido de não conhecer do recurso especial.

    CERTIDÃO DE JULGAMENTO

    TERCEIRA TURMA

    Número Registro: 2006⁄0274168-7 REsp 909968 ⁄ DF

    Números Origem: 20020110927266 20060070083703 200601897104 92726602

    PAUTA: 08⁄04⁄2008 JULGADO: 08⁄04⁄2008

    Relator

    Exmo. Sr. Ministro ARI PARGENDLER

    Ministra Impedida

    Exma. Sra. Ministra : NANCY ANDRIGHI

    Presidente da Sessão

    Exmo. Sr. Ministro SIDNEI BENETI

    Subprocurador-Geral da República

    Exmo. Sr. Dr. JOÃO PEDRO DE SABOIA BANDEIRA DE MELLO FILHO

    Secretária

    Bela. SOLANGE ROSA DOS SANTOS VELOSO

    AUTUAÇÃO

    RECORRENTE : CAIO MARIO RENAULT

    ADVOGADO : THIAGO PEDROSA FIGUEIREDO E OUTRO (S)

    RECORRIDO : MARIA VERA TEIXEIRA BRANT

    ADVOGADA : JANINE MALTA MASSUDA E OUTRO (S)

    ASSUNTO: Civil - Contrato - Compra e Venda - Imóvel - Escritura

    SUSTENTAÇÃO ORAL

    Pelo recorrente: Dr. Paulo Roberto Roque

    Pela recorrida: Dr. Fernando Neves da Silva

    CERTIDÃO

    Certifico que a egrégia TERCEIRA TURMA, ao apreciar o processo em epígrafe na sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:

    A Turma, por unanimidade, não conheceu do recurso especial, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros Massami Uyeda e Sidnei Beneti votaram com o Sr. Ministro Relator.

    Impedida a Sra. Ministra Nancy Andrighi.

    Ausente, justificadamente, a Sra. Ministra Nancy Andrighi.

    Brasília, 08 de abril de 2008

    SOLANGE ROSA DOS SANTOS VELOSO

    Secretária"

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