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16 de Abril de 2024
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    STJ nega valor mensal a dependentes de vítima de acidente que já recebem pensão integral

    Publicado por Expresso da Notícia
    há 17 anos

    Quando já receberem pensão integral por morte de magistrado em acidente, os seus dependentes não acumulam outra pensão supostamente devida pelo causador do acidente. A decisão foi dada por maioria na Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) e seguiu o voto-vista da ministra Nancy Andrighi ( foto ) . O relator do processo, ministro Humberto Gomes de Barros, havia admitido a possibilidade de se acumular pensões, sendo seu voto acompanhado pelo ministro Carlos Alberto Menezes Direito.

    Em janeiro de 1996, Leonello Pedro Paludo, então juiz do Tribunal de Alçada do Rio Grande do Sul, faleceu em acidente de trânsito quando seu carro colidiu com automóvel guiado por Mariane Beatriz Schilling Ling. No acidente ficou seriamente ferida a esposa do juiz, Célia Fleig Paludo, autora da ação. Segundo testemunhas, Mariane Beatriz estaria dirigindo além da velocidade permitida e invadiu a faixa do juiz. Como no momento chovia forte, a motorista perdeu o controle e causou o acidente. O automóvel era de propriedade da empresa Petropar S/A e estava emprestado para Mariane.

    Mariane foi considerada responsável pelo acidente, e a Petropar, co-responsável. Inicialmente, a Justiça do Rio Grande do Sul não concedeu pensão a ser paga pela causadora do acidente, pois a viúva e filhos e descendentes já receberiam pensão integral do Estado. Após a apelação da viúva, o Tribunal de Justiça gaúcho (TJRS) mudou a sentença e condenou Mariane e a Petropar a pagarem o equivalente à metade dos vencimentos líquidos do juiz até o ano em que a vítima completasse 72 anos e seis meses. Estabeleceu ainda o pagamento de juros compostos até a data do pagamento e determinou o pagamento de indenizações a título de danos materiais.

    Os réus alegaram que poderia ser considerado que o juiz teria culpa concorrente no acidente, já que ele guiava com uma carteira de habilitação vencida há mais de um ano. O TJ não aceitou essa argumentação, já que a vítima dirigia em sua própria mão e respeitando o limite de velocidade.

    Inconformados, Mariane e a Petropar interpuseram recurso especial no STJ. A Petropar afirmou que não poderia haver culpa in eligendo, já que Mariane seria habilitada e teria condições de guiar. O empréstimo gratuito de automóvel se enquadraria na categoria de contrato de comodato, não acarretando as responsabilidades de um vínculo empregatício. Para eles, deveria ser aplicada a teoria da guarda da coisa, em que o guardião se torna responsável pelo bem. Os dois insistiram também que o valor das indenizações seria excessivo e defenderam a impossibilidade de se acumular as pensões. A Petropar também insistiu na tese da culpa concorrente do juiz.

    Em seu voto, o ministro Humberto Gomes de Barros entendeu que averiguar se houve culpa concorrente exigiria a apreciação de provas, o que é proibido pela Súmula 7 do STJ. Ele também afastou a cobrança de juros compostos até a data do trânsito em julgado da ação. Esses pontos foram seguidos por unanimidade pelo restante da Turma. O ministro admitiu a acumulação de pensões, já que elas teriam natureza diversa. No seu voto-vista, a ministra Nancy Andrighi discordou deste último ponto.

    Segundo a magistrada, acumular as pensões seria um enriquecimento indevido. Para a ministra, a Súmula 229 do Supremo Tribunal Federal (STF ), que determina que indenização por acidentes não exclui o direito comum em caso de dolo ou culpa grave, não se aplicaria ao caso. Seriam devidas várias indenizações, como danos morais e materiais, despesas médicas, pensão, etc. A ministra entende que a indenização seria um ressarcimento do que foi razoavelmente perdido pela vítima. Como a pensão já cobriria integralmente os vencimentos do falecido juiz, não haveria razão para acumular. Acompanharam esse entendimento os ministros Ari Pargendler e Castro Filho.

    Leia, abaixo, a íntegra da decisão:

    "RECURSO ESPECIAL Nº 604.758 - RS (2003⁄0190651-1)

    RELATOR : MINISTRO HUMBERTO GOMES DE BARROS

    R.P⁄ACÓRDÃO : MINISTRA NANCY ANDRIGHI

    RECORRENTE : PETROPAR S⁄A

    ADVOGADO : CARLOS ROBERTO KIRCHHOF E OUTROS

    RECORRENTE : MARIANE BEATRIZ SCHILLING LING

    ADVOGADOS : LUÍS RENATO FERREIRA DA SILVA E OUTROS

    ROBERTO PIERRI BERSCH E OUTRO

    RECORRIDO : CÉLIA FLEIG PALUDO E OUTROS

    ADVOGADOS : MARÇO ANTÔNIO BIRNFELD E OUTROS

    FLÁVIO PANCARO DA SILVA E OUTROS

    EMENTA

    Civil. Processo civil. Recursos especiais. Ação de indenização por danos morais e materiais. Acidente de trânsito que levou juiz de direito à morte. Responsabilidade solidária entre a condutora do veículo que causou o acidente e a pessoa jurídica proprietária do automóvel. Aplicação da teoria da guarda da coisa. Alegação de violação ao art. 535 do CPC afastada. Discussão sobre o valor da compensação devida a título de danos morais. Condenação ao pagamento de pensão mensal vitalícia à esposa do falecido, não obstante esta receber pensão vitalícia integral do Estado, em face de específica legislação aplicável à magistratura. Impossibilidade. Incidência de juros compostos. Afastamento. Pretensão de reconhecimento de culpa concorrente da vítima do acidente de trânsito, pois esta dirigia com a carteira de habilitação vencida. Análise da situação fática relativa ao acidente que exclui a concorrência de culpas.

    - Não há violação ao art. 535 do CPC quando ausentes omissão, contradição ou obscuridade no acórdão.

    - A aplicação da teoria da guarda da coisa na análise da responsabilidade civil decorrente de acidentes de trânsito é costumeira nos tribunais nacionais. Precedentes.

    - A revisão dos valores definidos como compensação por danos morais só é possível quando houver inaceitável descompasso entre o que ordinariamente se concede em hipóteses semelhantes e o que determinou a decisão recorrida; tal fato não ocorre na presente hipótese.

    - O acórdão recorrido determinou o pagamento à viúva, por parte da causadora do evento danoso, de pensão mensal vitalícia em face dos danos materiais sofridos; contudo, o falecido era magistrado estadual e, em face de seu cargo, a viúva tem assegurada pensão mensal vitalícia, a ser paga pelo Estado, no valor integral dos vencimentos do de cujus.

    - A indenização por dano material, porém, só pode dizer respeito ao ressarcimento daquilo que, em cada situação, representou uma diminuição indevida do patrimônio do ofendido.

    - Colocada tal premissa, o que se verifica é a existência de uma previsão legal de assunção dos riscos previdenciários relativos à carreira da magistratura pelo Estado, em razão da importância e seriedade do exercício desse mister.

    - Se assim é, e se o acórdão afirma existir o direito da viúva à percepção integral, a título de pensão por morte, dos vencimentos do magistrado falecido, qualquer quantia recebida a mais sobre a mesma base representaria a fruição de uma vantagem pecuniária indevida, ultrapassando os limites do ressarcimento ao dano causado.

    - A jurisprudência do STJ é firme em permitir a incidência dos juros compostos apenas quando já houver trânsito em julgado da sentença penal condenatória.

    - Não é possível reconhecer a existência de culpa concorrente da vítima pelo simples fato de que esta dirigia com a carteira de habilitação vencida. Muito embora tal fato seja, por si, um ilícito, não há como presumir a participação culposa da vítima no evento apenas com base em tal assertiva, pois essa presunção é frontalmente dissociada, na presente hipótese, das circunstâncias fáticas narradas nos autos e admitidas como verdadeiras pelo acórdão recorrido.

    Recurso especial de PETROPAR S⁄A não conhecido; recurso especial de MARIANE BEATRIZ SCHILLING LING parcialmente provido.

    ACÓRDÃO

    Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da TERCEIRA TURMA do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas constantes dos autos, prosseguindo no julgamento, após o voto-vista do Sr. Ministro Castro Filho, por unanimidade, não conhecer do recurso especial da Petropar S⁄A, e, por maioria, conhecer e dar parcial provimento ao recurso especial de Mariane Beatriz Shilling Ling, nos termos do voto da Sra. Ministra Nancy Andrighi. Votaram com a Sra. Ministra Nancy Andrighi os Srs. Ministros Ari Pargendler e Castro Filho. Votaram vencidos os Srs. Ministros Humberto Gomes de Barros e Carlos Alberto Menezes Direito. Lavrará o acórdão a Sra. Ministra Nancy Andrighi.

    Brasília (DF), 17 de outubro de 2006 (Data do Julgamento)

    MINISTRA NANCY ANDRIGHI

    Relatora

    RECURSO ESPECIAL Nº 604.758 - RS (2003⁄0190651-1)

    RELATÓRIO

    MINISTRO HUMBERTO GOMES DE BARROS: Coexistem nestes autos dois recursos especiais a desafiar acórdão resumido nesta ementa:

    "APELAÇÃO. ACIDENTE DE TRÂNSITO. COLISÃO. MORTE.

    1 .Preliminares de nulidade da sentença afastadas.

    1.1 Decisão ultra petita. Nulidade parcial. Possibilidade de excluir o ponto que extrapolou o pedido da parte em embargos declaratórios ao majorar a verba honorária fixada em favor dos patronos dos demandantes de 12% para 15% sobre o valor da condenação.

    1.2.Não é nula a decisão que relegou para liquidação de sentença a comprovação de despesas médicas, fisioterápicas e com empregada ocorridas durante o processamento do feito. Necessidade de tratamento que restou demonstrada pela prova dos autos.

    2.Afastamento da prefacial de ilegitimidade passiva. Empresa proprietária do veículo, que tem dever de guarda deste e da coerente escolha de quem deve utilizá-lo. Culpa in eligendo.

    3.Responsabilidade pela ocorrência do acidente. Definida a culpa da motorista demandada que, em tentativa de ultrapassagem, em dia chuvoso, perdeu o controle do veículo, fazendo-o deslizar lateralmente em direção à pista contrária e chocando-se contra o veículo da vítima.

    4.Danos materiais.

    4.1 .Despesas médicas devidamente comprovadas. Recibos e notas em nome da demandante Célia. Ressarcimento deferido. Incomprovação de que houvessem tais dispêndios sido cobertos por plano de saúde.

    4.2.Exclusão do ressarcimento do valor despendido com rescisão contratual de empregada que já trabalhava com a autora Célia antes do acidente. Prova que dá conta de mera substituição de empregada doméstica, que, ao que tudo indica, não foi dada causa pelo acidente.

    5.Pensionamento. Devido em face do ato ilícito e não compensável com a pensão previdenciária, porque de naturezas diversas. Precedentes. Aquilatação do grau de culpa e dedução das despesas pessoais da vítima (1⁄3), no arbitramento da pensão, estabelecida, no caso concreto, em metade dos vencimentos líquidos da vítima.

    6. Danos morais. É devida a reparação, à razão de R$40.000,00 a cada filho do autor, por morte da vítima, e em dobro à viúva, em face das lesões físicas e sofrimento no tratamento.

    7.Juros compostos. São devidos (pela condutora do automóvel) sobre todas as parcelas indenizatórias por expressa disposição legal ( Art. 1.544 , CC ), ainda que não transitada em julgada a sentença penal condenatória.

    8.Honorários advocatícios. Arbitrados reciprocamente, em proporção diversa, sem a necessária correspondência com a pretensão decaída.

    Parcial provimento dos apelos, afastadas as preliminares suscitadas". (fl. 1186⁄1187)

    Ambas as rés manejaram embargos de declaração que foram rejeitados por ausência de qualquer dos vícios enumerados no Art. 535 do CPC .

    Daí os recursos especiais, que admitidos, vieram a exame deste Superior Tribunal.

    A recorrente PETROPAR S⁄A queixa-se de ofensa ao Art. 535 , II , do CPC , e violação dos Arts. 1427, 1521, 1528 e 1529, do CC⁄1916 , além de divergência jurisprudencial. Afirma que o juízo singular equivocou-se ao optar pela teoria da"responsabilidade da guarda", com base nos Arts. 1427 , 1528 e 1.529 do CC , quando seria o caso da aplicação do inciso III do Art. 1.521 do mesmo diploma legal. Por fim, queixa-se do excessivo dano moral fixado.

    A outra recorrente, por seu turno, recorre especialmente, afirmando violação dos Arts. 535, II, do CPC ; 1059 , 1060 e 1544, do CC⁄1916 , além do dissídio jurisprudencial.

    Os recursos foram impugnados pelos autores.

    RECURSO ESPECIAL Nº 604.758 - RS (2003⁄0190651-1)

    RESPONSABILIDADE CIVIL - ACIDENTE DE TRÂNSITO - OBRIGAÇÃO DE INDENIZAR - SOLIDARIEDADE - PROPRIETÁRIO DO VEÍCULO.

    - Quem permite que terceiro conduza seu veículo é responsável solidário pelos danos que o permissionário culposamente causou.

    DANO MORAL - FIXAÇÃO - RAZOABILIDADE.

    - Dano moral fixado em parâmetro razoável, inexistindo abuso a justificar a excepcional intervenção do STJ a respeito.

    PENSIONAMENTO - CUMULAÇÃO.

    - A pensão previdenciária pode ser cumulada com aquela contemplada no direito comum, porque de naturezas e origens diversas.

    JUROS COMPOSTOS ( ART. 1544 do CC⁄1916 ).

    - Os juros compostos ( Art. 1544 do CC ) são devidos apenas se houver crime com sentença transitada em julgado.

    CULPA CONCORRENTE DA VÍTIMA.

    - Questão não examinada no âmbito do STJ, por vedação da Súmula 7 .

    VOTO-VENCIDO

    MINISTRO HUMBERTO GOMES DE BARROS (Relator): Nenhum dos recursos afirmando ofensa ao Art. 535 do CPC procede.

    O Tribunal de origem decidiu de forma clara, precisa, dentro dos limites objetivos da pretensão recursal e com fundamentação suficiente para solucionar a lide. Os embargos de declaração não se prestam para o reexame da decisão, como pretendido pelas recorrentes. Também não há defeito de fundamentação a ensejar a nulidade do julgado, mas sim motivação contrária aos interesses das embargantes.

    Da preliminar de ilegitimidade passiva da PETROPAR S⁄A:

    Quanto à preliminar de ilegitimidade passiva, o acórdão recorrido não discrepa da orientação assentada neste Superior Tribunal, a dizer que:

    " Quem permite que terceiro conduza seu veículo é responsável solidário pelos danos causados culposamente pelo permissionário "( REsp 343.649 ⁄HUMBERTO);

    " - O proprietário de veículo que o empresta a terceiro responde por danos causados pelo seu uso culposo. (...) "( REsp 243.878 ⁄PÁDUA);

    "(...) o proprietário do veículo responde solidariamente com o condutor do veículo. Em outras palavras, a responsabilidade do dono da coisa é presumida,

    invertendo-se, em razão disso, o ônus da prova. (...)"( REsp 145.358 ⁄SÁLVIO).

    Além dos paradigmas referidos, estão nesse sentido: REsp 335.058 ⁄HUMBERTO; REsp 402.886 ⁄NANCY; REsp 116.828 ⁄ROSADO; REsp 6.852 ⁄EDUARDO, dentre outros.

    Do dano moral e da sua excessiva fixação:

    A recorrente alega, de igual forma, que a fixação da indenização por danos morais em 111,11 salários mínimos por família afronta os parâmetros legais estabelecidos, além de dissentir da jurisprudência dominante neste campo," que conduzem uma média indenizatória que não excede os 100 salários mínimos ". Sustenta, ainda, que"o controle de tais decisões tem sido aceito pelo STJ, que em mais de uma oportunidade, acaba por enfrentar o tema e reduzi-los". Aponta precedentes nesse sentido.

    Com efeito, conforme nossa jurisprudência, o valor da indenização por danos morais pode ser revisto neste Tribunal quando, por ser desproporcional, contrariar a lei, mostrando-se irrisório ou exorbitante.

    Na hipótese dos autos, 307,69 salários mínimos para a viúva, e 153,84 salários mínimos por filho, mostra-se, em princípio, razoável, não colidindo com os precedentes deste Superior Tribunal de Justiça, que, em casos de morte, tem estabelecido valores ainda maiores ( REsp 530.618 e REsp 330.288 ⁄PASSARINHO; REsp 331.279 ⁄FUX).

    Da cumulação da pensão previdenciária com aquele imposto pelo ato ilícito:

    Conforme bem registrado pelo acórdão recorrido, é entendimento assente na Segunda Seção que a pensão previdenciária pode ser cumulada com aquela contemplada no direito comum, porque de naturezas e origens diversas.

    Nesse sentido, lembro: REsp 56.272 ⁄NAVES, REsp 62.125 e REsp 235.393 ⁄SÁLVIO, e AGA 213.226 ⁄DIREITO.

    Incide, assim, quanto ao tema, a Súmula 83 .

    Dos juros compostos ( Art. 1544 do CC⁄1916 ):

    Sobre a matéria, por oportuno, vale aqui transcrever o que decidiu a Terceira Turma, quando do julgamento do REsp 390.050 , em voto conduzido pelo eminente Ministro Castro Filho, in verbis:

    "(....) considerando que a indenização por ato ilícito, tipificado em direito penal, deve ser integral e completa, ocorrendo da forma mais ampla, nela devem ser incluídos os juros compostos, desde a data do crime, nos termos do que dispõe o art. 1.544 do Código Civil de 1916 , sem correspondente no novel código em vigor:

    "Além dos juros ordinários, contados proporcionalmente ao valor do dano, e desde o tempo do crime, a satisfação compreende os juros compostos."

    Nessas condições, conforme assinala Yussef Said Cahali, "se a conduta do agente, pela sua gravidade, assume a conotação de crime propriamente dito, e não de simples ilícito civil, a sua responsabilidade indenizatória será agravada pela incidência de juros compostos." (Responsabilidade Civil do Estado, São Paulo, 1982, p. 124).

    A origem da cominação em tela remonta ao Art. 26 do Código Criminal de 1830 , que lhe atribuía caráter punitivo, daí a sua aplicação restrita a criminosos, como tal reconhecidos em sentença criminal, no dizer de José de Aguiar Dias (Da Responsabilidade Civil, Rio de Janeiro, 1997, p. 775).

    Considerando, assim, que a pena se restringe à pessoa do condenado e que os juros compostos decorrem de punição do crime, estes não podem incidir sobre o responsável civil que não seja, concomitantemente, responsável penal, posição essa que, embora criticada por Arnaldo Rizzardo, predomina na doutrina e na jurisprudência pátrias.

    Nesse sentido, aliás, pronunciou-se o Sr. Ministro Sálvio de Figueiredo, no julgamento do REsp 263.733 ⁄SP, DJ 02⁄04⁄01, de que foi relator:

    "O nosso ordenamento jurídico não autoriza o deferimento de tais juros fora das hipóteses do Art. 1.544 do Código Civil , o que importa dizer que o nosso direito não contempla a possibilidade de deferi-los na responsabilidade civil carente do direito penal, como na espécie, como reiteradamente tem proclamado esta Corte, na linha da doutrina, (...)"

    Confiram-se, ainda, no âmbito dessa egrégia Seção: REsp 162.563 ⁄SP, DJ 03⁄11⁄98 (Rel. Min. Waldemar Zveiter), REsp 23.873 ⁄SP, DJ 08⁄08⁄94 (Rel. Min. Ruy Rosado de Aguiar), e REsp 49.899 ⁄GO, DJ 08⁄08⁄94 (Rel. Min. Eduardo Ribeiro).

    Essa orientação, vale lembrar, inspirou a edição do enunciado nº 186 da Súmula desta Corte, verbis:

    "Nas indenizações por ato ilícito, os juros compostos somente são devidos por aquele que praticou o crime."

    Ora, se concebermos a aplicação dos juros compostos como conseqüência do crime e, por imperativo lógico, da condenação no juízo criminal, tenho que a sua incidência dependerá do trânsito em julgado da sentença que reconhecer a responsabilidade penal, que, daí, irão retroagir ao tempo em que o ato ilícito fora praticado.

    Essa posição, ao meu sentir, se mostra mais consentânea com a ordem constitucional vigente, que tem por corolários os princípios da presunção de inocência e do devido processo legal, sendo ainda assegurado ao acusado o direito à ampla defesa".

    A teor dessa orientação, os juros compostos apenas serão devidos se houver crime com sentença transitada em julgado, o que não ocorre na espécie.

    Da culpa concorrente da vítima:

    No que respeita à afirmação de culpa concorrente da vítima, o recurso não merece trânsito. Do acórdão recorrido, percebe-se que o afastamento da culpa concorrente decorreu do conjunto de provas carreado aos autos, atraindo, portanto, a incidência da Súmula 7 .

    Não conheço do recurso da PETROPAR S⁄A. Provejo em parte o recurso de Mariane Schilling Ling, apenas para afastar a incidência dos juros compostos, em razão da ausência do trânsito em julgado da sentença penal condenatória.

    CERTIDÃO DE JULGAMENTO

    TERCEIRA TURMA

    Número Registro: 2003⁄0190651-1 REsp 604758 ⁄ RS

    Números Origem: 1196453185 70003670809

    PAUTA: 16⁄06⁄2005 JULGADO: 16⁄06⁄2005

    Relator

    Exmo. Sr. Ministro HUMBERTO GOMES DE BARROS

    Presidenta da Sessão

    Exma. Sra. Ministra NANCY ANDRIGHI

    Subprocurador-Geral da República

    Exmo. Sr. Dr. FRANCISCO DIAS TEIXEIRA

    Secretário

    Bel. MARCELO FREITAS DIAS

    AUTUAÇÃO

    RECORRENTE : PETROPAR S⁄A

    ADVOGADO : CARLOS ROBERTO KIRCHHOF E OUTROS

    RECORRENTE : MARIANE BEATRIZ SCHILLING LING

    ADVOGADOS : LUÍS RENATO FERREIRA DA SILVA E OUTROS

    ROBERTO PIERRI BERSCH E OUTRO

    RECORRIDO : CÉLIA FLEIG PALUDO E OUTROS

    ADVOGADOS : MARÇO ANTÔNIO BIRNFELD E OUTROS

    FLÁVIO PANCARO DA SILVA E OUTROS

    ASSUNTO: Civil - Responsabilidade Civil - Indenização - Acidente - Transporte Rodoviário ⁄ Trânsito - Dano Material c⁄c Moral

    CERTIDÃO

    Certifico que a egrégia TERCEIRA TURMA, ao apreciar o processo em epígrafe na sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:

    Após o voto do Sr. Ministro Humberto Gomes de Barros, não conhecendo do recurso especial da Petropar S⁄A, e conhecendo do recurso especial de Mariane Beatriz Schilling Ling e dando-lhe parcial provimento, no que foi acompanhado pelo Sr. Ministro Carlos Alberto Menezes Direito, pediu vista a Sra. Ministra Nancy Andrighi. Aguarda o Sr. Ministro Castro Filho.

    Brasília, 16 de junho de 2005

    MARCELO FREITAS DIAS

    Secretário

    RECURSO ESPECIAL Nº 604.758 - RS (2003⁄0190651-1)

    RELATOR : MINISTRO HUMBERTO GOMES DE BARROS

    RECORRENTE : PETROPAR S⁄A

    ADVOGADO : CARLOS ROBERTO KIRCHHOF E OUTROS

    RECORRENTE : MARIANE BEATRIZ SCHILLING LING

    ADVOGADO : LUÍS RENATO FERREIRA DA SILVA E OUTROS

    RECORRIDO : CÉLIA FLEIG PALUDO E OUTROS

    ADVOGADO : FLÁVIO PANCARO DA SILVA E OUTROS

    VOTO-VISTA

    A EXMA. SRA. MINISTRA NANCY ANDRIGHI:

    Recursos especiais interpostos por PETROPAR S⁄A e MARIANE BEATRIZ SCHILLING LING, ambos com fundamento nas alíneas a e c do permissivo constitucional.

    Ação: de indenização por danos materiais e compensação por danos morais, movida por CÉLIA FLEIG PALUDO E OUTROS em desfavor dos ora recorrentes.

    Segundo consta da inicial, a ora recorrente MARIANE foi a única culpada por acidente de trânsito que causou a morte do marido e pai dos ora recorridos, à época juiz do Tribunal de Alçada do Rio Grande do Sul, além de graves danos físicos e psicológicos à ora recorrida CÉLIA.

    A primeira recorrente seria solidariamente responsável com a causadora do dano por ser ela a proprietária do veículo.

    Sentença: após longa e tumultuada marcha processual, o pedido foi julgado parcialmente procedente para condenar as ora recorrentes, solidariamente, ao ressarcimento dos danos materiais relativos ao funeral da vítima, das despesas médicas realizadas pela ora recorrida, à indenização pela perda total do veículo acidentado e às despesas de viagem de um dos filhos do casal, assim como ao pagamento de compensação por danos morais, assim estipulado: R$ 80.000,00 (oitenta mil reais) à recorrida CÉLIA, pela perda do marido, e mais R$ 40.000,00 (quarenta mil reais), pelos danos pessoais sofridos no acidente do qual também foi vítima, e R$ 40.000,00 (quarenta mil reais) a cada um dos três filhos do casal.

    Acórdão: tanto os recorridos quanto os recorrentes apelaram da sentença, assim decidindo o TJRS ao dar parcial provimento a todos os recursos:

    "APELAÇÃO. ACIDENTE DE TRÂNSITO. COLISÃO. MORTE.

    1.Preliminares de nulidade da sentença afastadas.

    1.1.Decisão ultra petita. Nulidade parcial. Possibilidade de excluir o ponto que extrapolou o pedido da parte em embargos declaratórios ao majorar a verba honorária fixada em favor dos patronos dos demandantes de 12% para 15% sobre o valor da condenação.

    1.2.Não é nula a decisão que relegou para liquidação de sentença a comprovação de despesas médicas, fisioterápicas e com empregada ocorridas durante o processamento do feito. Necessidade de tratamento que restou demonstrada pela prova dos autos.

    2.Afastamento da prefacial de ilegitimidade passiva. Empresa proprietária do veículo, que tem dever de guarda deste e da coerente escolha de quem deve utilizá-lo. Culpa in eligendo .

    3.Responsabilidade pela ocorrência do acidente. Definida a culpa da motorista demandada que, em tentativa de ultrapassagem, em dia chuvoso, perdeu o controle do veículo, fazendo-o deslizar lateralmente em direção à pista contrária e chocando-se contra o veículo da vítima.

    4.Danos materiais.

    4.1.Despesas médicas devidamente comprovadas. Recibos e notas em nome da demandante Célia. Ressarcimento deferido. Incomprovação de que houvessem tais dispêndios sido cobertos por plano de saúde.

    4.2.Exclusão do ressarcimento do valor despendido com rescisão contratual de empregada que já trabalhava com a autora Célia antes do acidente. Prova que dá conta de mera substituição de empregada doméstica, que, ao que tudo indica, não foi dada causa pelo acidente.

    5.Pensionamento. Devido em face do ato ilícito e não compensável com a pensão previdenciária, porque de naturezas diversas. Precedentes. Aquilatação do grau de culpa e dedução das despesas pessoais da vítima (1⁄3), no arbitramento da pensão, estabelecida, no caso concreto, em metade dos vencimentos líquidos da vítima.

    6. Danos morais. É devida a reparação, à razão de R$40.000,00 a cada filho do autor, por morte da vítima, e em dobro à viúva, em face das lesões físicas e sofrimento no tratamento.

    7.Juros compostos. São devidos (pela condutora do automóvel) sobre todas as parcelas indenizatórias por expressa disposição legal ( art. 1.544 , CC ), ainda que não transitada em julgada a sentença penal condenatória.

    8.Honorários advocatícios. Arbitrados reciprocamente, em proporção diversa, sem a necessária correspondência com a pretensão decaída.

    Parcial provimento dos apelos, afastadas as preliminares suscitadas"(fls. 1186⁄1187).

    Embargos de declaração: interpostos pelos ora recorrentes, foram ambos rejeitados.

    Recurso especial da PETROPAR S⁄A: alega violação ao art. 535 do CPC e aos arts. 1427, 1521, 1528 e 1529 do CC⁄16 , além de divergência jurisprudencial, porque:

    a) houve negativa de prestação jurisdicional;

    b) não deve ser aplicada a teoria da guarda da coisa, conforme feito pelo acórdão recorrido, para condenar a empresa proprietária do veículo em razão de acidente provocado por terceiro na condução do automóvel gratuitamente cedido a este, se o motorista possuía habilitação adequada a tanto; e

    c) excessivo o valor fixado a título de compensação por danos morais.

    Recurso especial de MARIANE BEATRIZ SCHILLING LING: alega violação ao art. 535 do CPC e aos arts. 1059, 1060, 1544 , todos do CC⁄16 , além de divergência jurisprudencial, porque:

    a) houve negativa de prestação jurisdicional;

    b) a condenação ao pagamento de pensão mensal vitalícia representa enriquecimento sem causa, à medida que já garantida, por disposição legal relativa às prerrogativas da magistratura, a pensão previdenciária correspondente ao vencimento integral da vítima à sua viúva;

    c) não é possível reconhecer-se a incidência de juros compostos, porquanto não transitada em julgado a condenação na esfera penal;

    d) o valor fixado a título de compensação por danos morais é excessivo;

    e) deve ser reconhecida a concorrência de participação culposa no evento, já que a vítima estava dirigindo com a carteira de habilitação vencida.

    Voto: o i. Min. Humberto Gomes de Barros não conheceu do recurso da PETROPAR S⁄A e deu parcial provimento ao recurso de MARIANE SCHILLING LING, apenas para afastar a incidência dos juros compostos, em razão da ausência do trânsito em julgado da sentença penal condenatória.

    Reprisados os fatos, decido.

    Do recurso especial interposto por PETROPAR S⁄A:

    a) Da alegada violação ao art. 535 do CPC .

    Alega a primeira recorrente ocorrência de violação ao art. 535 do CPC , porque teria o acórdão se recusado a expressamente abordar a incidência do art. 1521 do CC⁄16 , este o fundamento da defesa da PETROPAR S⁄A, ao preferir admitir a aplicação da teoria do fato da coisa e responsabilizar solidariamente a empresa pelo evento danoso.

    Não há omissão alguma no acórdão recorrido. Conforme tranqüila posição jurisprudencial, não é obrigado o Tribunal a se manifestar expressamente sobre todos os pontos e fundamentos alegados pelas partes, se, bem fundamentada a decisão, a adoção da tese vencedora implica, necessariamente, na exclusão daqueles motivos trazidos pelo sucumbente em suas razões.

    Um suposto acerto ou erro de fundo da decisão não pode ser confundido com omissão no julgamento, de modo que se afasta a alegada violação ao art. 535 do CPC .

    b) Da aplicação da teoria da guarda da coisa.

    Nesse ponto, irresigna-se o ora recorrente contra a aplicação da chamada 'teoria da guarda da coisa' como fundamento para sua condenação solidária.

    Assim a questão foi tratada pelo acórdão recorrido, na esteira da sentença:

    "Por analogia aos artigos 1.427 , 1.528 e 1.529 do Código Civil , a doutrina defende, no Brasil, a Teoria da Responsabilidade na Guarda da Coisa, que consagra a responsabilidade objetiva.

    É que a responsabilidade por evento de trânsito não pode ser vista de modo simplório, descontextualizado. A tendência é que se amplie como única forma de combater esse mal do século que ceifa tantas vidas"(fls. 1198).

    Retira-se do acórdão que o automóvel envolvido no acidente pertencia à PETROPAR S⁄A, e estava emprestado para uso pessoal à também recorrente MARIANE, que é esposa de um dos membros da família controladora daquela empresa.

    A aplicação da teoria da guarda da coisa, da forma como aceita pelo acórdão recorrido, é costumeira nos tribunais nacionais; cite-se, do STF, o Recurso Extraordinário nº 70054⁄SP, Rel. Min. Amaral Santos, julgado em 16.04.1971; do STJ, o AgRg no Ag nº 574415 ⁄RS, 3ª Turma, Rel. Min. Menezes Direito, DJ de 04.10.2004; o REsp 62163 ⁄RJ, 4ª Turma, Rel. Min. Cesar Asfor Rocha, DJ de 09.08.1998 e o REsp 343649 ⁄MG, 3ª Turma, Rel. Min. Humberto Gomes de Barros, DJ de 25.02.2004, este último assim ementado:

    "RESPONSABILIDADE CIVIL - ACIDENTE DE TRÂNSITO - OBRIGAÇÃO DE INDENIZAR - SOLIDARIEDADE - PROPRIETÁRIO DO VEÍCULO.

    - Quem permite que terceiro conduza seu veículo é responsável solidário pelos danos causados culposamente pelo permissionário.

    - Recurso provido".

    Quanto ao ponto, portanto, é de se reconhecer a incidência da Súmula nº 83 &# 8260 ;STJ .

    c) Do valor fixado a título de compensação por danos morais.

    Insurge-se a PETROPAR S⁄A quanto à solidariedade na condenação pelos danos morais e pelo valor definido no acórdão, que reputa excessivo.

    A questão da solidariedade na condenação, que se pretende ver afastada no tocante aos danos morais, ao argumento de que inexistente a culpa da empresa, restou na verdade resolvida pelo quanto exposto no item anterior, à medida que a aplicação dos precedentes confirmam o acórdão no tocante à existência de culpa do proprietário do veículo que o empresta ao causador do dano e da solidariedade passiva quanto à condenação de ambos.

    No que diz respeito ao valor compensatório, conquanto efetivamente possível a revisão dos valores anteriormente definidos já em sede de recurso especial, tal circunstância só é de ser aceita quando houver inaceitável descompasso entre o que ordinariamente se concede em hipóteses semelhantes e o que determinou a decisão recorrida.

    Isso porque, embora não se admita uma tarifação da compensação, pois" é da essência do dano moral ser este compensado financeiramente a partir de uma estimativa que guarde alguma relação necessariamente imprecisa com o sofrimento causado, justamente por inexistir fórmula matemática que seja capaz de traduzir as repercussões íntimas do evento em um equivalente financeiro "( REsp nº 663.196 ⁄PR, de minha relatoria), aqueles parâmetros devem ser utilizados como mecanismos para o reconhecimento de excessos.

    Tal situação não ocorre na presente lide. O acórdão fixou o valor compensatório em R$

    (oitenta mil reais) à viúva e R$

    (quarenta mil reais) a cada um dos três filhos, isso levando-se em conta as circunstâncias do evento danoso e as condições pessoais daqueles que no acidente se envolveram, matéria que não pode ser subtraída do conhecimento e livre apreciação do Tribunal de segundo grau de jurisdição, mais uma vez sob pena de se criar uma indesejável 'tarifação' dos danos morais.

    Em resumo, se tantos são os acórdãos que fixaram valores inferiores em hipóteses que possam parecer assemelhadas, quantos outros existem condenando os responsáveis em valores maiores: a título exemplificativo, estão o REsp 577787 ⁄RJ, 3ª Turma, Rel. Min. Castro Filho, DJ de 20.09.2004 e o AgRg no Ag 495955 ⁄SP, 4ª Turma, Rel. Min. Aldir Passarinho Júnior, DJ de 25.02.2004.

    Do recurso especial interposto por MARIANE BEATRIZ SCHILLING LING:

    a) Da alegada violação ao art. 535 do CPC .

    Alega a segunda recorrente ocorrência de violação ao art. 535 do CPC , porque teria o acórdão se recusado a expressamente abordar a incidência dos arts. 1059 e 1060 do CC⁄16 quando tratou da possibilidade de cumulação de pensão previdenciária e pensão vitalícia.

    Aqui, igualmente, não se vislumbra omissão alguma no acórdão recorrido, pois a matéria foi devidamente abordada. Não se reconhece violação ao art. 535 do CPC se a irresignação diz respeito ao posicionamento de mérito da decisão, que expressamente adota posição diversa daquela que é defendida pelo embargante.

    b) Da cumulação entre pensão previdenciária e pensão vitalícia.

    Sustenta a recorrente, nesse ponto, que o acórdão propicia o enriquecimento indevido da recorrida ao determinar o pagamento de pensão mensal vitalícia no valor de metade da remuneração antes percebida pelo seu falecido marido.

    Isso porque a viúva já teria garantida a pensão previdenciária correspondente à integralidade dos vencimentos da magistratura, de modo que o acórdão colocou-a numa situação financeira que seria impossível de ser alcançada caso o evento danoso não tivesse ocorrido.

    A questão, aqui, passa ao largo do que dispõe a Súmula nº 229 &# 8260 ;STF , assim redigida:"A indenização acidentária não exclui a do direito comum, em caso de dolo ou culpa grave do empregador", porque, na hipótese, não se cogita da cumulação entre a indenização derivada do seguro de acidentes de trabalho, prevista pela Lei nº 6367 ⁄76 , com aquela passível de ser obtida pela aplicação do direito comum, quando teria incidência a jurisprudência da 3ª e 4ª Turma no sentido de que"A indenização previdenciária é diversa e independente da contemplada no direito comum, inclusive porque têm elas origens distintas: uma, sustentada pelo direito acidentário; a outra, pelo direito comum, uma não excluindo a outra (enunciado n. 229 &# 8260 ;STF), podendo, inclusive, cumularem-se"( Resp nº 268909 ⁄SP; 4ª Turma. Rel. Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira, DJ de 07.05.2001).

    Na presente hipótese, a controvérsia tem origem no recebimento simultâneo de pensão vinculada às regras previdenciárias da magistratura do Estado do Rio Grande do Sul, carreira esta seguida pelo falecido marido da ora recorrida, com a pensão mensal vitalícia derivada de ato ilícito que, nessa condição, originou danos materiais.

    Assim colocada a questão, dois são os ângulos que devem ser conjugados para o correto deslinde da controvérsia, pois há o prisma do beneficiário das pensões cumuladas e o prisma daqueles que as pagam, ou seja, do responsável pelo dano e do Estado-previdência.

    Na presente demanda, houve pedido para ressarcimento e compensação de diversos tipos de danos, em acordo com o que permite o ordenamento jurídico: assim, quanto à viúva do magistrado falecido, foram levantados como danos materiais os decorrentes dos gastos com tratamento médico e do ressarcimento pela perda total do veículo, estes a serem indenizados em valor fixo correspondente à perda patrimonial experimentada, e ainda os decorrentes da perda da percepção da remuneração do varão, que deveriam ser ressarcidos, de acordo com a inicial, pelo pensionamento vitalício a ser pago pelos autores do dano, na proporção de dois terços daqueles vencimentos.

    Da própria análise dos pedidos resta claro que a indenização por dano material só pode dizer respeito ao ressarcimento daquilo que, em cada situação, representou uma diminuição indevida do patrimônio do ofendido. Os danos emergentes e os lucros cessantes são quantificáveis, ao contrário dos danos morais; e se tal diferença muito contribuiu para que, durante tempos, houvesse resistência à admissão da possibilidade de compensação financeira destes, não há que se perder de vista essa marcante característica dos danos materiais, uma vez já devidamente sedimentados os conceitos relativos às duas modalidades de responsabilidade civil.

    Se assim é, e se o acórdão afirma existir o direito da viúva à percepção integral, a título de

    pensão por morte vitalícia, dos vencimentos do magistrado falecido, qualquer quantia recebida a mais sobre a mesma base representaria a fruição de uma vantagem pecuniária indevida, ultrapassando os limites do ressarcimento ao dano causado.

    Os danos emergentes, portanto, configurar-se-iam na perda daqueles valores que, após o desconto da parcela ordinariamente consumida pelo próprio varão, seriam destinados à mantença de seu núcleo familiar; para a generalidade dos casos, tal valor costuma ser definido pela jurisprudência em dois terços dos rendimentos totais, conforme feito, aliás, pela petição inicial.

    Resta, ainda, um terço do valor total dos vencimentos da magistratura do Rio Grande do Sul, que também será, pelo Estado, destinado à viúva; tal percentagem, à guisa de alguma justificativa para além do simples respeito a disposição legal que determina o pagamento da pensão em sua integralidade, poder-se-ia dispor ao título de lucros cessantes em face de futuras progressões na carreira do magistrado, que ainda não se havia encerrado, de modo a exaurir as possibilidades de indenização por danos materiais.

    Vencida a análise da questão sob o prisma da beneficiária das pensões, resta alterar o ângulo da abordagem para a posição dos ora recorrentes, pois não é de se negar que o quanto exposto supra gera uma certa perplexidade se, em contradita, fosse afirmado que tal postura poderia levar a uma violação do princípio da igualdade, à medida em que representaria uma espécie de isenção de responsabilidade aos ofensores em face, exclusivamente, de uma característica pessoal relativa à carreira seguida pela vítima fatal do acidente.

    Mas não há que se confundir as situações. Colocada a premissa maior de que o dano material deve ser, apenas, ressarcido na medida em que desfalcado o patrimônio do lesado, o que se verifica é a existência de uma previsão legal de assunção dos riscos previdenciários relativos à carreira da magistratura pelo Estado, em razão da importância e seriedade do exercício desse mister, não sendo exagero afirmar que tal providência está inserida no contexto da previsão constitucional da imparcialidade do juiz, pois a garantia de pensionamento integral à família do magistrado é fator tranquilizador ao desempenho íntegro da atividade judicante.

    Se o Estado assume tal risco, caberia a ele, então, cobrar o ressarcimento pelo que passará a despender daquele que, efetivamente, foi o causador do dano. Ou seja, não se está a advogar uma quebra do princípio da igualdade; o ofensor continua tão responsável quanto sempre o seria, fosse a vítima profissional não protegido por específica norma previdenciária. A questão resume-se, apenas, a transferir a titularidade do crédito ao Estado, que de antemão e por lei, como se fora um garante daquele tipo de evento, assumiu os riscos do sinistro.

    É o que se procede, por exemplo, e aos milhares, com os contratos de seguro por danos materiais, nos quais a seguradora, após arcar com o ressarcimento dos prejuízos advindos do evento danoso, procura seu direito de regresso contra seu verdadeiro causador. Portanto, cabe ao Estado procurar o ressarcimento pelos gastos que passou a ter, pois não há que se olvidar que o cargo do juiz falecido passou, necessariamente, a ser ocupado por outro membro do Poder Judiciário, que está recebendo vencimentos idênticos à pensão paga à viúva.

    O voto é, portanto, no sentido de afastar a obrigação ao pagamento da pensão mensal vitalícia no valor de cinqüenta por cento dos vencimentos do magistrado falecido, conforme havia sido determinado pelo acórdão.

    c) Da incidência de juros compostos.

    Quanto ao ponto, entendeu o acórdão que os juros compostos" São devidos (apenas pela condutora do automóvel - Súmula 186 do STJ ) sobre todas as parcelas indenizatórias por expressa disposição legal, eis que caracterizado o fato como crime culposo ( art. 1.544 , CC ), ainda que não transitada em julgado a sentença penal condenatória "(fls. 1206).

    Ocorre que a jurisprudência do STJ é firme em apenas permitir a incidência dos juros compostos quando já houver trânsito em julgado da sentença penal condenatória, conforme o seguinte precedente, de minha relatoria:

    "Civil. Agravo no agravo de instrumento. Indenização por dano moral. Prática de crime. Incidência de juros compostos. Necessidade de reconhecimento do delito por sentença penal condenatória.

    - Os juros compostos previstos no art. 1.544 do CC16 são devidos quando a obrigação de indenizar resultar de ilícito penal, pressupondo-se, sempre, a existência de sentença condenatória transitada em julgado. Precedentes.

    Agravo no agravo de instrumento desprovido"( AgRg no Ag 581395 ⁄RS; 3ª Turma, DJ de 13.09.2004).

    Não houve, ainda, o trânsito em julgado da condenação na esfera criminal, porquanto pendente de julgamento, no STF, agravo de instrumento contra decisão que negou seguimento a recurso extraordinário.

    Portanto, é de se afastar a incidência dos juros compostos sobre a condenação, para adequar a decisão recorrida à jurisprudência do STJ.

    d) Do valor fixado a título de compensação por danos morais.

    Nada há, aqui, a acrescentar ao quanto exposto na análise da idêntica irresignação levantada pela recorrente PETROPAR S⁄A, de modo que ficam reiteradas as conclusões ali expendidas para afastar a alegação de excesso no valor compensatório.

    e) Da concorrência de participação culposa no evento.

    Neste ponto, sustenta a recorrente MARIANE que o acórdão recorrido não poderia ter afastado a hipótese de concorrência de participação culposa no evento danoso, porque a vítima fatal estava dirigindo com carteira de habilitação vencida há nove meses.

    De tal circunstância, extrai a recorrente a necessária existência, também por parte da vítima, de falta no dever de cuidado, que se projetou de forma relevante no modo e nas conseqüências do acidente e que não poderiam ser olvidadas quando se perquiriu acerca da distribuição das responsabilidades pelo evento.

    O deslinde da questão depende de que se tome por base, de forma clara, a análise fática procedida pelo Tribunal de origem, esta impossível de ser revista em recurso especial.

    Nesse ponto, pertencem ao acórdão recorrido os seguintes trechos:

    "A localização dos danos e a posição final dos veículos confirmam a versão da testemunha Uiraçaba Machado. Admitida a hipótese de que a camioneta Parati tivesse invadido a contramão de direção, os danos do automóvel Logus não se localizariam em sua lateral direita.

    Além disso, o próprio laudo de engenharia, encomendado pela parte ré e acostado com a resposta da demandada Mariane (fls. 301 a 400), aponta na figura 7 (simulação, fl. 330) que, no momento 1, o automóvel Logus já se encontrava desgovernado e que o ponto de impacto se deu na mão de direção da camioneta da vítima.

    Esses os pontos que tenho como relevantes para definir como causa do acidente a culpa, em grau médio, consideradas as circunstâncias da pista (com zonas de exudação) e do tempo chuvoso, na modalidade de imperícia, da demandada Mariane, a qual, em tentativa de ultrapassagem, acionou o freio e veio a perder o controle do veículo, fazendo-o deslizar lateralmente"(fls. 1201⁄1202).

    E, do voto do revisor, ainda:

    " (...) tenho que o conjunto probatório autoriza a concluir que o veículo conduzido pela ré Mariane invadiu a pista por onde trafegava a Parati manejada pela vítima, provocando o choque que atirou para fora da pista de sua mão de direção este último veículo, jogando-o para baixo do acostamento, permanecendo atravessado sobre as pistas o Logus "(fls. 1210).

    Não há discussão, portanto, sobre as circunstâncias do acidente, que se toma por ocorrido da forma como relatado pelo TJRS; ou seja, a ora recorrente MARIANE invadiu a pista contrária ao realizar uma ultrapassagem, colhendo o automóvel da vítima fatal, que vinha em sentido contrário.

    A seguir, tira o acórdão a conclusão jurídica dessa análise, relativamente ao ponto abordado:

    " O fato de encontrar-se vencida a carteira de motorista da vítima traduz irregularidade administrativa, não interferindo no desempenho do condutor que não demonstrou imprudência ou imperícia na ocasião "(fls. 1210⁄1211); assim entendendo também o segundo revisor, nos seguintes termos:

    " O fato de ele não estar regularmente habilitado é uma mera infração administrativa e não significa que ele não tivesse condições de conduzir o veículo normalmente, como, pelo visto, já dirigia há um bom tempo "(fls. 1213).

    Assim colocada a questão, verifica-se o acerto do acórdão em focar a responsabilidade pelo evento danoso apenas naquilo que a ele diga respeito de forma direta, excluindo da análise outras condutas que, apesar de contrárias ao ordenamento jurídico como um todo, demonstraram irrelevância no curso causal dos acontecimentos.

    É evidente que constitui infração ao ordenamento jurídico a condução de veículo automotor por parte daquele que possui carteira de habilitação vencida. Contudo, a matéria controversa na presente hipótese diz respeito a um acidente específico de trânsito que vitimou um dos motoristas e que, nos termos do acórdão recorrido, foi causado exclusivamente pela recorrente ao avançar na faixa contrária de direção.

    A tese da recorrente - no sentido de que, uma vez vencida a carteira de motorista do falecido, presumir-se-ia a inaptidão deste para conduzir seu veículo - não pode se sobrepor à própria dinâmica dos fatos. Na análise destes, o Tribunal de Justiça, de forma soberana, entendeu que a conduta da ré, ora recorrente, foi a única causa do resultado, e que a especial condição demonstrada pela vítima não teve a menor influência neste. Nessas circunstâncias, não há que se falar em presunção de culpa concorrente da vítima, porque, para tanto, seria necessário colocar sob segundo plano a própria forma como se deu o acidente.

    Em resumo, portanto, o ilícito relativo à condução de veículo automotor com carteira de habilitação vencida não pode afastar a culpa exclusiva da ora recorrente, porque os fatos não indicaram qualquer participação da vítima no curso do evento danoso.

    Vilson Rodrigues Alves, em obra específica sobre o tema (Acidentes de trânsito e responsabilidade civil. Campinas: Bookseller, Tomo I, págs. 388⁄389), fornece situação idêntica à presente hipótese como exemplo de que a preexistência de um ilícito por parte de um dos motoristas não pode ser erigida a causa concorrente do dano causado exclusivamente pelo outro, nos seguintes termos:

    “Observe-se, antes, que no suporte fático que se considere pode haver concorrência de atos infracionais de trânsito sem influência na responsabilidade civil.

    Com efeito, em determinado acidente de trânsito pode-se vislumbrar violação a deveres jurídicos preexistentes tanto do motorista A) como quanto do motorista B), sem que somente por essa concorrência de infrações se pré-exclua a responsabilidade civil exclusivamente de A), pelos danos a B), ou, pelos danos a A), de B).

    Tal ocorrerá se uma das condutas contrárias a direito, ou algumas menos uma delas, não se inserir, ou não se inserirem, na linha de desdobramento físico-causal do evento, de modo a conceber-se o nexo de causalidade apenas entre as demais condutas contrárias a direito, ou a conduta contrária a direito remanescente, e o fato lato sensu de eficácia lesiva à vítima, ou às vítimas.

    Dessarte, verificando-se que o motorista A) não usava o cinto de segurança obrigatório, tem-se infração a regra jurídica de trânsito por ele. Contudo, se o acidente ocorreu em decorrência exclusivamente da conduta contrária a direito do motorista B), também ele infrator de trânsito, não se pode em razão do ato negativo a) operar detração na indenizabilidade de b), se em a) não está concausa do conteúdo da prestação b)”.

    Nada há, portanto, a alterar no acórdão recorrido, quanto a este ponto.

    Forte em tais razões, NÃO CONHEÇO do recurso especial interposto por PETROPAR S⁄A e CONHEÇO do recurso especial interposto por MARIANE BEATRIZ SCHILLING LING, dando-lhe PARCIAL PROVIMENTO para excluir da condenação imposta a obrigação ao pagamento da pensão mensal vitalícia e afastar a incidência dos juros compostos.

    É como voto.

    RECURSO ESPECIAL Nº 604.758 - RS (2003⁄0190651-1)

    RELATOR : MINISTRO HUMBERTO GOMES DE BARROS

    RECORRENTE : PETROPAR S⁄A

    ADVOGADO : CARLOS ROBERTO KIRCHHOF E OUTROS

    RECORRENTE : MARIANE BEATRIZ SCHILLING LING

    ADVOGADOS : LUÍS RENATO FERREIRA DA SILVA E OUTROS

    ROBERTO PIERRI BERSCH E OUTRO

    RECORRIDO : CÉLIA FLEIG PALUDO E OUTROS

    ADVOGADOS : MARÇO ANTÔNIO BIRNFELD E OUTROS

    FLÁVIO PANCARO DA SILVA E OUTROS

    VOTO

    O EXMO. SR. MINISTRO CASTRO FILHO (Relator): Sra. Ministra Presidente, a mim me parece que não se nega a possibilidade da cumulação da pensão previdenciária com aquela resultante de condenações por atos ilícitos, mas, em caso como esse, data venia do ilustre Relator, pelo seu douto entendimento, parece-me que o voto de V. Exa. está bem encaminhado, primeiro porque, filosoficamente, a finalidade da pensão é evitar que a família do funcionário fique no desamparo; segundo, se a pensão resulta da morte de um empregado ou de um agente do Poder Público, como é o caso do juiz, que tem proventos integrais na aposentadoria e pensão integral à viúva no caso de morte, parece-me que não seria, realmente, até de conveniência, autorizar a condenação de uma outra pensão com o mesmo título, a menos que se criasse uma outra figura.

    Ministro CASTRO FILHO

    RECURSO ESPECIAL Nº 604.758 - RS (2003⁄0190651-1)

    RELATOR : MINISTRO HUMBERTO GOMES DE BARROS

    RECORRENTE : PETROPAR S⁄A

    ADVOGADO : CARLOS ROBERTO KIRCHHOF E OUTROS

    RECORRENTE : MARIANE BEATRIZ SCHILLING LING

    ADVOGADOS : LUÍS RENATO FERREIRA DA SILVA E OUTROS

    ROBERTO PIERRI BERSCH E OUTRO

    RECORRIDO : CÉLIA FLEIG PALUDO E OUTROS

    ADVOGADOS : MARÇO ANTÔNIO BIRNFELD E OUTROS

    FLÁVIO PANCARO DA SILVA E OUTROS

    VOTO

    O EXMO. SR. MINISTRO CASTRO FILHO: Mas não se está isentando da responsabilidade. Está sendo condenado e, inclusive, reconhece-se a responsabilidade pela reparação do dano moral, que causa uma dor profunda na família. Os outros danos materiais também estão sendo reconhecidos; apenas a pensão.

    Veja bem, Ministro Humberto Gomes de Barros, V. Exa. disse que, então, matar um juiz seria mais conveniente do que matar quem não o seja - para o homicida -, mas, de outro lado, se entendermos diferentemente, como V. Exa. está entendendo, iríamos passar a considerar o juiz morto mais valioso que o juiz vivo.

    Ministro CASTRO FILHO

    RECURSO ESPECIAL Nº 604.758 - RS (2003⁄0190651-1)

    RELATOR : MINISTRO HUMBERTO GOMES DE BARROS

    RECORRENTE : PETROPAR S⁄A

    ADVOGADO : CARLOS ROBERTO KIRCHHOF E OUTROS

    RECORRENTE : MARIANE BEATRIZ SCHILLING LING

    ADVOGADOS : LUÍS RENATO FERREIRA DA SILVA E OUTROS

    ROBERTO PIERRI BERSCH E OUTRO

    RECORRIDO : CÉLIA FLEIG PALUDO E OUTROS

    ADVOGADOS : MARÇO ANTÔNIO BIRNFELD E OUTROS

    FLÁVIO PANCARO DA SILVA E OUTROS

    VOTO

    O EXMO. SR. MINISTRO CASTRO FILHO: A perda que está sofrendo é de caráter sentimental e, por isso, a reparação.

    Se fosse esse juiz, por exemplo, também, professor, nesse caso estaria certo em condenar no que percebesse a esse título; se já fosse aposentado e estivesse advogando, renderia, então, à viúva, pensão igualmente pela parte que perdera, além dessa da Previdência Social, em função do cargo.

    Então, com as minhas máximas vênias ao ilustre Relator, no ponto, acompanho a Sra. Ministra Nancy Andrighi.

    Ministro CASTRO FILHO

    RECURSO ESPECIAL Nº 604.758 - RS (2003⁄0190651-1)

    RELATOR : MINISTRO HUMBERTO GOMES DE BARROS

    RECORRENTE : PETROPAR S⁄A

    ADVOGADO : CARLOS ROBERTO KIRCHHOF E OUTROS

    RECORRENTE : MARIANE BEATRIZ SCHILLING LING

    ADVOGADOS : LUÍS RENATO FERREIRA DA SILVA E OUTROS

    ROBERTO PIERRI BERSCH E OUTRO

    RECORRIDO : CÉLIA FLEIG PALUDO E OUTROS

    ADVOGADOS : MARÇO ANTÔNIO BIRNFELD E OUTROS

    FLÁVIO PANCARO DA SILVA E OUTROS

    VOTO

    O EXMO. SR. MINISTRO CASTRO FILHO: Sra. Ministra Nancy Andrighi, não levo muito em consideração a questão da habilitação ou não, mas da culpa e da participação no evento. Se a pessoa, embora inabilitada, não contribuiu de forma alguma...

    Ministro CASTRO FILHO

    RECURSO ESPECIAL Nº 604.758 - RS (2003⁄0190651-1)

    RELATOR : MINISTRO HUMBERTO GOMES DE BARROS

    RECORRENTE : PETROPAR S⁄A

    ADVOGADO : CARLOS ROBERTO KIRCHHOF E OUTROS

    RECORRENTE : MARIANE BEATRIZ SCHILLING LING

    ADVOGADOS : LUÍS RENATO FERREIRA DA SILVA E OUTROS

    ROBERTO PIERRI BERSCH E OUTRO

    RECORRIDO : CÉLIA FLEIG PALUDO E OUTROS

    ADVOGADOS : MARÇO ANTÔNIO BIRNFELD E OUTROS

    FLÁVIO PANCARO DA SILVA E OUTROS

    VOTO

    O EXMO. SR. MINISTRO CASTRO FILHO: Nesse ponto, sim.

    Ministro CASTRO FILHO

    CERTIDÃO DE JULGAMENTO

    TERCEIRA TURMA

    Número Registro: 2003⁄0190651-1 REsp 604758 ⁄ RS

    Números Origem: 1196453185 70003670809

    PAUTA: 16⁄06⁄2005 JULGADO: 16⁄08⁄2005

    Relator

    Exmo. Sr. Ministro HUMBERTO GOMES DE BARROS

    Presidenta da Sessão

    Exma. Sra. Ministra NANCY ANDRIGHI

    Subprocurador-Geral da República

    Exmo. Sr. Dr. FRANCISCO DIAS TEIXEIRA

    Secretário

    Bel. MARCELO FREITAS DIAS

    AUTUAÇÃO

    RECORRENTE : PETROPAR S⁄A

    ADVOGADO : CARLOS ROBERTO KIRCHHOF E OUTROS

    RECORRENTE : MARIANE BEATRIZ SCHILLING LING

    ADVOGADO : LUÍS RENATO FERREIRA DA SILVA E OUTROS

    RECORRIDO : CÉLIA FLEIG PALUDO E OUTROS

    ADVOGADO : FLÁVIO PANCARO DA SILVA E OUTROS

    ASSUNTO: Civil - Responsabilidade Civil - Indenização - Acidente - Transporte Rodoviário ⁄ Trânsito - Dano Material c⁄c Moral

    CERTIDÃO

    Certifico que a egrégia TERCEIRA TURMA, ao apreciar o processo em epígrafe na sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:

    Prosseguindo o julgamento, após o voto-vista da Sra. Ministra Nancy Andrighi, não conhecendo do recurso especial da Petropar S⁄A e conhecendo do recurso especial de Mariane Beatriz Schiling Ling e dando-lhe parcial provimento, no que foi acompanhada parcialmente, no caso concreto, pelo Sr. Ministro Castro Filho, verificou-se empate no julgamento, devendo o mesmo ser renovado, com a inclusão em pauta.

    Participaram do julgamento os Srs. Ministros Carlos Alberto Menezes Direito, Nancy Andrighi e Castro Filho.

    Brasília, 16 de agosto de 2005

    MARCELO FREITAS DIAS

    Secretário

    CERTIDÃO DE JULGAMENTO

    TERCEIRA TURMA

    Número Registro: 2003⁄0190651-1 REsp 604758 ⁄ RS

    Números Origem: 1196453185 70003670809

    PAUTA: 01⁄09⁄2005 JULGADO: 01⁄09⁄2005

    Relator

    Exmo. Sr. Ministro HUMBERTO GOMES DE BARROS

    Presidenta da Sessão

    Exma. Sra. Ministra NANCY ANDRIGHI

    Subprocurador-Geral da República

    Exmo. Sr. Dr. MAURÍCIO DE PAULA CARDOSO

    Secretário

    Bel. MARCELO FREITAS DIAS

    AUTUAÇÃO

    RECORRENTE : PETROPAR S⁄A

    ADVOGADO : CARLOS ROBERTO KIRCHHOF E OUTROS

    RECORRENTE : MARIANE BEATRIZ SCHILLING LING

    ADVOGADO : LUÍS RENATO FERREIRA DA SILVA E OUTROS

    RECORRIDO : CÉLIA FLEIG PALUDO E OUTROS

    ADVOGADOS : MARÇO ANTÔNIO BIRNFELD

    FLÁVIO PANCARO DA SILVA E OUTROS

    ASSUNTO: Civil - Responsabilidade Civil - Indenização - Acidente - Transporte Rodoviário ⁄ Trânsito - Dano Material c⁄c Moral

    SUSTENTAÇÃO ORAL

    Sustentou oralmente o Dr. Roberto Pierri Bersch, pelo primeiro recorrente.

    CERTIDÃO

    Certifico que a egrégia TERCEIRA TURMA, ao apreciar o processo em epígrafe na sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:

    Renovando o julgamento após o voto do Sr. Ministro Humberto Gomes de Barros, não conhecendo do recurso especial da Petropar S⁄A e, conhecendo do recurso especial de Mariane Beatriz Schilling Ling e dando-lhe parcial provimento, pediu vista o Sr. Ministro Ari Pargendler. Aguardam os Srs. Ministros Carlos Alberto Menezes Direito, Nancy Andrighi e Castro Filho.

    Brasília, 01 de setembro de 2005

    MARCELO FREITAS DIAS

    Secretário

    RECURSO ESPECIAL Nº 604.758 - RS (2003⁄0190651-1)

    Terceira Turma - 03.08.2006

    VOTO-VISTA

    EXMO. SR. MINISTRO ARI PARGENDLER:

    Trata-se de homicídio, embora na forma culposa, resultante de acidente de trânsito, imputado a Mariane Beatriz Schilling Ling, que dirigia veículo pertencente a Petropar Sociedade Anônima, razão pela qual o tribunal a quo fez por condená-las ao pagamento de pensão mensal, de natureza alimentícia, à Célia Fleig Paludo, correspondente “à metade dos vencimentos líquidos da vítima” (fls. 1.205, 7º vol.).

    O desate da divergência instalada no âmbito da Turma depende de saber:

    a) se houve concorrência de culpas; e

    b) se a viúva da vítima, já contemplada com a pensão oficial equivalente à remuneração de Juiz de Alçada, cargo ocupado pelo falecido marido, tem direito à prestação alimentícia prevista no art. 1.537 , II , do Código Civil .

    Salvo melhor juízo, o só fato de que a carteira de habilitação da vítima estava vencida não repercute na atribuição de culpa; trata-se de infração administrativa, punível apenas nesse âmbito.

    Já as posições confrontantes quanto à indenização dos danos materiais remontam às instâncias ordinárias, tendo a sentença proclamado a impossibilidade da cumulação com a pensão oficial, à base da seguinte fundamentação:

    “Entendo que a pretensão à pensão deva ser indeferida porque a viúva já recebe pensão integral por morte do acidentado.

    A farta jurisprudência exibida nos autos se justifica para aqueles casos em que após o óbito da vítima os beneficiários passam a perceber pensão do INSS, muito aquém do que o trabalhador auferia em vida pelo seu trabalho. Ou mesmo, quando a própria vítima, tornando-se incapacitada parcial ou totalmente para o trabalho, diminui sua renda salarial ou seus rendimentos como autônomo.

    Neste ponto, as esposas dos juízes, ao lado de outras categorias, são privilegiadas pela legislação existente e amparadas por decisão do STF.

    E, uma vez aposentada, também não tem direito à pensão por incapacidade funcional para o trabalho. A incapacidade para os atos normais da própria vida (andar, correr...) serão reparados com indenização por danos morais. No caso, não vejo viabilidade na cumulação da pensão” (fls. 1.042⁄1.043, 6º vol.).

    Já o tribunal a quo reformou a sentença com a só justificativa de que “tem a jurisprudência assentado o entendimento de que os alimentos por ato ilícito e os benefícios previdenciários são incompensáveis, porque diversas as naturezas” (fl. 1.204, 7º vol.).

    A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça tem admitido a cumulação de indenizações, uma considerando o só evento morte, outra considerando a responsabilidade de quem o causou, sempre que a primeira delas resulte de prestação da vítima, v.g., seguro de vida.

    Esse entendimento foi assim justificado por Pontes de Miranda:

    “Quando as coisas lesadas estão seguradas, o que o ofendido recebe do seguro não se computa como vantagem ou lucro dedutível. A morte, ou a lesão corporal, ou outro fato ilícito, aí, foi apenas elemento do suporte fáctico da regra jurídica; não é o suporte fáctico, como se passa com o fato ilícito da morte (v.g., homicídio). Do contrato de seguro irradiam-se direitos, pretensões e ações para o segurado e para o segurador: quando o segurador paga o seguro, por ter ocorrido a morte, ou outro fato, contrapresta, pois o segurado pagou os prêmios, periodicamente. Não se irradiou do fato ilícito a prestação do seguro. Seria absurdo que o estar segura a pessoa, ou estar seguro o bem atingido pelo fato ilícito, redundasse em proveito do responsável pela indenização pelo fato ilícito” (Tratado de Direito Privado, Tomo XXVI, Editor Borsoi, Rio de Janeiro, 1959, pp. 54⁄55).

    Na espécie, trata-se de situação diferente: a pensão oficial percebida pela viúva da vítima decorre de lei, sem que o de cujus tenha contribuído para o respectivo custeio.

    Quid juris?

    Enneccerus, em parágrafo lapidar, contrapõe ambas as situações, preconizando tratamento jurídico diverso para cada qual, in verbis:

    “Con la pretensión de indemnización que ostenta um lesionado o la viuda de un muerto se han de compensar las pretensiones de pensión o de viuvedad que surgen, por ministério de la ley, a consecuencia de la lesión o muerte, ya que aparecen como consecuencia jurídica de la lesión o muerte, pero no las pretensiones que derivan de un contrato de seguro en orden al pago de una indemnización, renta, subsidio de enfermedad, etc., pues estas pretensiones han sido adquiridas a título oneroso en virtud de una contraprestación (prima, cuota) y representan, por consiguiente, en primer lugar la consecuencia del contrato de seguro y del pago de las primas” (Derecho de Obligaciones, Bosch, Casa Editorial, Barcelona, Vol. I, Segundo Tomo, p. 89).

    Carvalho Santos endossa essa orientação para o nosso ordenamento jurídico, por ser uma “conseqüência do princípio, segundo o qual a pessoa que tem direito a ser indenizada não deve enriquecer-se por meio da indenização, mas apenas obter o ressarcimento do dano efetivo” ( Código Civil Brasileiro Interpretado, Livraria Freitas Bastos S⁄A, Volume XXI, 11ª edição, p. 107).

    A solução pode parecer esdrúxula, porque dela resulta que o homicídio de um juiz, ou de um funcionário público, não implicava no regime constitucional anterior à Emenda nº 20 , de 15 de dezembro de 1998 , a indenização de danos materiais.

    Daí a crítica de Euclides de Mesquita, para quem ela “transformaria a finalidade das aposentadorias ou das pensões em causa de impunidade para os autores do ato ilícito” (A Compensação no Direito Civil Brasileiro, Edição Universitária de Direito, São Paulo, 1975, p. 146).

    Data venia, a indenização dos danos materiais não tem função punitiva. Ainda que também esse não seja o propósito da indenização pelos danos morais, o autor do ilícito sofre o respectivo desembolso como uma punição.

    Mas a indenização de danos materiais sem a existência de prejuízo seria, pior do que a dita impunidade, um verdadeiro contra-senso.

    Voto, por isso, no sentido de acompanhar o voto da Ministra Nancy Andrighi, salvo quanto à concorrência de culpas.

    CERTIDÃO DE JULGAMENTO

    TERCEIRA TURMA

    Número Registro: 2003⁄0190651-1 REsp 604758 ⁄ RS

    Números Origem: 1196453185 70003670809

    PAUTA: 01⁄09⁄2005 JULGADO: 03⁄08⁄2006

    Relator

    Exmo. Sr. Ministro HUMBERTO GOMES DE BARROS

    Presidente da Sessão

    Exmo. Sr. Ministro CASTRO FILHO

    Subprocurador-Geral da República

    Exmo. Sr. Dr. MAURÍCIO DE PAULA CARDOSO

    Secretária

    Bela. SOLANGE ROSA DOS SANTOS VELOSO

    AUTUAÇÃO

    RECORRENTE : PETROPAR S⁄A

    ADVOGADO : CARLOS ROBERTO KIRCHHOF E OUTROS

    RECORRENTE : MARIANE BEATRIZ SCHILLING LING

    ADVOGADOS : LUÍS RENATO FERREIRA DA SILVA E OUTROS

    ROBERTO PIERRI BERSCH E OUTRO

    RECORRIDO : CÉLIA FLEIG PALUDO E OUTROS

    ADVOGADOS : MARÇO ANTÔNIO BIRNFELD E OUTROS

    FLÁVIO PANCARO DA SILVA E OUTROS

    ASSUNTO: Civil - Responsabilidade Civil - Indenização - Acidente - Transporte Rodoviário ⁄ Trânsito - Dano Material c⁄c Moral

    CERTIDÃO

    Certifico que a egrégia TERCEIRA TURMA, ao apreciar o processo em epígrafe na sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:

    Prosseguindo no julgamento, após o voto-vista do Sr. Ministro Ari Pargendler, não conhecendo do recurso especial da Petropar S⁄A, e, conhecendo e dando parcial provimento ao recurso especial de Mariane Beatriz Shilling Ling, pediu vista o Sr. Ministro Menezes Direito. Aguardam os Srs. Ministros Nancy Andrighi e Castro Filho.

    Brasília, 03 de agosto de 2006

    SOLANGE ROSA DOS SANTOS VELOSO

    Secretária

    RECURSO ESPECIAL Nº 604.758 - RS (2003⁄0190651-1)

    VOTO-VISTA

    O EXMO. SR. MINISTRO CARLOS ALBERTO MENEZES DIREITO:

    Ação de indenização ajuizada pelos recorridos em decorrência do falecimento do marido e pai dos autores e graves lesões na mulher em acidente de trânsito em que se aponta a responsabilidade dos réus.

    A sentença julgou parcialmente procedente a ação, indeferindo o pedido de pensão e as despesas de rescisão do contrato de trabalho. A pensão foi afastada pelo Juiz" porque a viúva já recebe pensão integral por morte do acidentado "(fl. 1012).

    O Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul proveu a apelação para deferir, em parte, a pensão,"equivalente à metade dos vencimentos líquidos da vítima, até a idade em que esta completaria 72 anos e seis meses de vida; estabelecer juros compostos, quanto à demandada Mariane; reduzir a 12% o percentual da verba honorária devida ao patrono dos autores"(fl. 1215). Quanto à culpa da ré Mariane, entendeu o Tribunal local ser exclusiva," não exsurgindo dos autos tenha a vítima concorrido para o trágico e lastimável acidente "(fl. 1210).

    Os embargos de declaração foram rejeitados.

    Os especiais são dos réus.

    O eminente Relator, Ministro Humberto Gomes de Barros, desproveu o especial da empresa e proveu o da ré Mariane" apenas para afastar a incidência dos juros compostos, em razão da ausência do trânsito em julgado da sentença penal condenatória ". Sobre a pensão, considerou ser possível cumular a pensão previdenciária com aquela decorrente do ato ilícito, porque de natureza e de origem diversas; sobre a culpa concorrente da vítima, aplicou a Súmula nº 7 da Corte.

    Em voto-vista, a Ministra Nancy Andrighi descartou a pensão mensal afirmando que o dano material deve ser ressarcido considerando o desfalque do patrimônio do lesado, o que não ocorre no caso, porque a vítima era Magistrado e já recebe a viúva pensão integral. Assim, o próprio estado teria legitimidade ativa para cobrar, pela via do regresso, o valor da pensão da responsável pela lesão, tal e qual se admite no tocante aos contratos de seguro. Daí que proveu o especial para afastar o pagamento da pensão mensal vitalícia de cinqüenta por cento dos vencimentos do Magistrado falecido, que foi acolhido pelo julgado. Da mesma forma que o Relator, considerou indevidos os juros compostos, mas, contrariamente, considerou haver a culpa concorrente relevando a circunstância de que o outro motorista que dirigia estava com a habilitação vencida.

    O Ministro Ari Pargendler, em voto-vista, afastou a culpa concorrente, porque o só fato de estar a carteira vencida"não repercute na atribuição de culpa; trata-se de infração administrativa, punível apenas nesse âmbito". No que concerne ao pagamento da pensão mensal, anotou que a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça tem admitido a cumulação de indenizações," uma considerando o só evento morte, outra considerando a responsabilidade de quem o causou, sempre que a primeira delas resulte de prestação da vítima, v.g., seguro de vida ". Lembrando lições de Pontes de Miranda, Carvalho Santos e Ennecerus, afirma que quando a vítima participa com contra-prestação, a cumulação é possível. Destaca o Ministro Ari Pargendler que a omissão"pode parecer esdrúxula, porque dela resulta que o homicídio de um juiz ou de um funcionário público, não implicava no regime constitucional anterior à Emenda n. 20 , de 15 de dezembro de 1998, a indenização de danos materiais", mencionando afirmação de Euclides Mesquita no sentido de que se transformaria a finalidade das aposentadorias ou das pensões em causa de imunidade para os autores dos atos ilícitos. Mas, assinalou o Ministro Ari Pargendler,"a indenização por danos materiais não tem função punitiva. Ainda que também esse não seja o propósito da indenização pelos danos morais, o autor do ilícito sofre o respectivo desembolso como uma punição". Por isso, prossegue a" indenização por danos materiais sem a existência de prejuízo seria, pior do que a dita impunidade, um verdadeiro contrasenso ". Daí que acompanhou, em parte, o voto-vista da Ministra Nancy Andrighi para afastar o pagamento da pensão.

    Pedi vista, embora já tenha votado, para examinar essa questão da cumulação da pensão do funcionário público com a do ato ilícito, que não me lembro, como asseverou o Ministro Pargendler, já ter sido enfrentada pela Corte. ~

    Foi-me distribuído parecer de Eduardo Ribeiro fazendo distinção da hipótese presente com a cumulação admitida em caso de pensão previdenciária. O erudito parecer examina o tema a partir da disciplina constitucional que em sua redação original estabelecia a contribuição para a cobertura. Mas, diz o parecer, a mesma situação não se dá com os servidores públicos e menos ainda no referente aos Magistrados,"bastando salientar que Ihes foi sempre reconhecido o direito à aposentadoria integral, não importando o período por que contribuíssem". Dessa forma, o direito à pensão,"que se assegurava aos dependentes dos servidores públicos em geral, derivava diretamente do mencionado dispositivo constitucional. Não se vinculava a requisito algum que não fosse o fato mesmo do óbito do servidor. Nem mesmo, como assinalado no acórdão cuja ementa se transcreveu, dependia de fonte de custeio. Tratava-se, pois, de um benefício incondicionado. Não constituía contraprestação de pagamentos que fossem efetuados pelo servidor. O direito existia, ocorresse, ou não, a cobrança de contribuições". Com isso, mesmo que os estados e municípios pudessem instituir contribuições para o custeio da previdência dos servidores, o fundamento mantinha-se íntegro, ancorado no art. 40 , § 5º , da Constituição Federal , porquanto"o direito à pensão não estava de nenhum modo condicionado a que houvesse a contribuição. Essa constituiria, apenas, uma fonte de receita, de inegável índole tributária, destinada a aliviar os orçamentos de estados e Municípios, e não uma condicionante do benefício". Sem dúvida, está no parecer, o caráter contributivo dos benefícios dos servidores dos estados e municípios nasce com a Emenda Constitucional nº 20 , de 1998, o que não tem significado nestes autos, porque o acidente se deu em 1996. Concluiu o parecer, então, que,"pelo menos até a Emenda 20 , o direito à pensão derivava diretamente da Constituição , não estando a depender de qualquer tributo a isso relacionado".

    Como visto, o que se vai examinar é se cabível a pensão quando a beneficiária recebe-a do estado em cenário aperfeiçoado antes da Emenda Constitucional nº 20 , de 1998. Melhor dizendo, a decisão refletirá posição da Corte sobre o vínculo da cumulação com a contra- prestação.

    Começo, porque reputo rica, pela lição dos Mazeaud. Quando cuidam da cumulação entre a indenização decorrente do ilícito e a pensão em decorrência do dano, mostram duas faces do tema, quais sejam, (1) malgrado o direito da pensão pode o lesado demandar do terceiro indenização integral?; (2) pode o estado que paga a pensão exercer o direito de regresso? (Traité Théorique et Pratique de Ia Responsablité Civile, Sirey, 4a ed., nº 255). Traçam a evolução legislativa que conduziu ao trato de situações particulares, por exemplo, no caso da Lei de 13 de agosto de 1947 que adotou um sistema misto (cit., nº 261), e no caso do seguro social (Ordonnance nº 5.454, de 19⁄10⁄45), em que se autoriza, nos acidentes de trabalho, cumulação em caso de morte, mas veda-se em caso de lesão ou doença (cit., nº 261). E, quando se trate de acidentes de direito comum, existe a proibição do ponto de vista prático diante da previsão do direito de regresso (cit., nº 261). Tratando especificamente dos funcionários públicos, os Mazeaud mostram que a integração destes no sistema geral de seguridade social, estabelecido pela Lei de 9 ⁄4⁄47, levou ao triunfo definitivo da regra da não-cumulação"(L'integration des fonctionnaires dans le système de securité sociale, réalisée para Ia loi du 9 avril 1947 (11), conduit au triomphe définitif de Ia régle du non-cumul"; cit., nº 265).

    Savatier também trata largamente do assunto enunciando, desde logo, o princípio segundo o qual a reparação é devida somente do dano. Assim, se já houve compensação em virtude do mesmo evento, não cabe a reparação e a vítima deixa de ser vítima, perdendo a ação indenizatória. Mas se um outro que não o responsável pela lesão deve compensar a vítima, ele próprio torna-se vítima e pode buscar o retorno ao seu patrimônio daquilo que despendeu (Traité De La Responsabilité Civile, LGDJ, T. II, 1939, nº 576 e seguintes).

    Genevieve Viney faz amplo estudo sobre a legislação de 1985 e 1993 considerando a reparação socializada e a responsabilidade civil (Traité de Droit Civil, Introduction à La Responsabilité, sob a direção de Jacques Ghestin, LGDJ, 2ª ed., 1995, números 28 e seguintes). No volume sobre as condições da responsabilidade, da mesma coleção, Geneviève Viney e Patrice Jourdan examinam a questão do dano já reparado, começando por tratar do risco da cumulação das indenizações, afirmando não ser possível, por meio de ação de responsabilidade civil, receber reparação por um dano já reparado. Os modernos civilistas franceses destacam a extensão do princípio da não-cumulação, analisando a lista de prestações constante da Lei de 1985 que pode dar lugar a recurso dos organismos sociais contra o responsável, consolidando a jurisprudência no sentido de que as prestações enumeradas são em princípio dedutíveis da indenização devida pelo responsável, afastando dessa regra, porém, aquelas prestações consideradas não indenizatórias ("non indemnitaires"). Geneviève Viney e Patrice Jourdan referem-se à Lei de 31&# 8260 ; 12⁄91 sobre o direito de reparação das vítimas contaminadas por HIV em decorrência de transfusão de sangue, que conservam o direito da ação civil, mas não têm direito à cumulação do valor com aquele obtido do fundo de garantias, criado para esse fim, se superior a soma das duas fontes ao valor que permita uma indenização integral do dano sofrido (Traité de Droit Civil, Les Conditions de La Responsabilité, sob a direção de Jacques Ghestin, LGDJ, 2ª ed., 1998, números 286 e seguintes).

    Sem dúvida, a questão da cumulação de prestações oriundas da previdência social e da ação de responsabilidade civil comporta enorme dificuldade, mesmo se tomarmos como critério aquele proposto por Pontes, Carvalho Santos e Ennecerus, trazido no voto do Ministro Ari Pargendler, que parece-me bem construída.

    Diga-se que a construção doutrinária francesa tomou por base para definir o critério da não-cumulação a perspectiva da sub-rogação do estado para haver do terceiro causador do dano, tal como nos casos de seguro, a soma do valor da pensão, caminho aventado pela eminente Ministra Nancy Andrighi. Mas é importante observar que o tema é objeto específico do direito positivo, o que não ocorre no Brasil que em nenhum momento legislou quer sobre a possibilidade de cumulação quer sobre a sub-rogação do estado em casos como o dos autos.

    O regime geral da previdência social que está hoje em vigor é contributivo, resultado, como já assinalado, da Emenda Constitucional nº 20 ⁄98 , explicitando a Emenda Constitucional nº 40 ⁄03 que o regime passa a aplicar-se ao Magistrado e aos membros do Ministério Público e dos Tribunais de Contas. É bom lembrar que até os pensionistas passam a pagar a contribuição para a previdência social ( art. 4º , da EC nº 40 ⁄03 ). Há, também, uma regra especial sobre a pensão por morte (§ 7º do art. 40 , com a redação dada pela EC nº 41 ⁄03 ) que remete à lei ordinária estabelecer o regime da pensão por morte, desde logo definindo que será igual"ao valor da totalidade dos proventos do servidor falecido, até o limite máximo estabelecido para os benefícios do regime geral de previdência social de que trata o art.20111111 , acrescido de setenta por cento da parcela excedente a este limite, caso aposentado à data do óbito", ou,"ao valor da totalidade da remuneração, até o limite máximo estabelecido para os benefícios do regime geral de previdência social de que trata o art.20111111 , acrescido de setenta por cento da parcela excedente a este limite, caso em atividade à data do óbito".

    Ora, por esse regime vê-se que a pensão é limitada, o que violentaria o princípio da reparação integral, que está na base da doutrina da responsabilidade civil. Adotada a orientação doutrinária mencionada antes, oriunda da construção francesa, haveria de ser admitida a complementação. E isso, realmente, não se pode alterar, sob pena de quebrar-se a espinha dorsal do sistema de responsabilidade civil aqui e alhures.

    Acontece que no caso dos autos, segundo se verifica, a viúva já recebe pensão integral. Daí o fundamento do acórdão no sentido de que cabível a cumulação, porque os alimentos decorrentes do ato ilícito e aquele da previdência social têm natureza diversa,

    Assim, neste feito, a decisão é apenas considerando esse aspecto. O só fato de ter origem diversa autoriza a acumulação? Será razoável que assim se caminhe considerando o princípio geral de que o dano material somente pode ser reparado se existente e se essa pensão não decorre de especial contribuição do servidor?

    Dúvida não há de que sem dano não há responsabilidade. Assim, se houve a reparação pelo seguro social, do estado, não haveria, em tese, como duplicar a indenização por dano material, sob pena de ensejarmos o enriquecimento ilícito. O estado, portanto, nessa situação poderia cobrar do responsável pelo ilícito o valor daquilo que despende em decorrência da antecipação do evento morte. Embora sem legislação especial sobre o tema, ao contrário do que ocorre na França, poder-se-ia, por via de interpretação, abrir esse caminho, como sempre acontece em nosso país, com a atividade judicante sendo fonte inesgotável de futura legislação.

    Mas isso seria admissível, como sustentam Pontes, Carvalho Santos e Ennecerus, se não houvesse participação contributiva direta do beneficiário direto ou indireto, ou seja, se ausente contra-prestação. O que quer dizer que presente a contra-prestação, a cumulação seria permitida.

    Veja-se, a título de exemplo, a questão do seguro obrigatório. O que orienta a jurisprudência da Corte autorizando a dedução, ou seja, vedando a cumulação é que se trata de seguro feito pelo proprietário do veículo que assume o pagamento do prêmio para responder pelos danos ocasionados por acidente em que esteja envolvido o seu veículo. Ora, se o seguro tem essa destinação específica, e a vítima recebe o valor segurado que foi feito pelo proprietário responsável pela lesão exatamente para prevenir-se contra esse fato, razão alguma existe para desconsiderar o valor recebido em decorrência do seguro. Ou, ainda, o que se dá com a indenização acidentária.

    Mas será que no caso da pensão por morte recebida do estado não existe concorrência do funcionário direta ou indireta. O parecer de Eduardo Ribeiro, jurista que todos respeitamos, mostra que a fonte em tal situação é tributária. A direta nós já vimos que está agasalhada no sistema constitucional desde a EC nº 20 ⁄98 , sendo que desde a EC nº 40 ⁄03 , alcança os Magistrados.

    Veja-se que o regime geral de previdência alcança especificamente a situação jurídica decorrente do fato de estar o lesado no exercício de função pública, que dá direito à pensão por morte independente de qualquer ato ilícito. Não tem a pensão previdenciária, seja aquela dos Magistrados seja aquela do regime geral, a função de reparar dano algum praticado por terceiro, mas, sim, a de dar proteção específica pela natureza da função pública que exerce. O ato ilícito antecipa o pagamento da verba, mas essa verba não decorre desse fato e sim da previsão estatutária, sem destinação a reparar o evento morte causado pelo autor da lesão.

    Mas não participaria o funcionário, sob o antigo regime, indiretamente do custeio da previdência, sendo, portanto, o pagamento da pensão uma contraprestação? Ou, ainda, não seria essa pensão por morte vinculada especificamente ao regime estatutário e, com isso, diferenciada daquela decorrente do ato ilícito, o que equivaleria também a uma contraprestação, isto é, uma contraprestação implícita?

    Pelo menos na minha compreensão, o regime da previdência estatal era, antes do estabelecimento de seu caráter contributivo, certo ou errado, coberto pela receita do estado, oriunda dos tributos cobrados em sua parte substantiva. No entanto, é preciso considerar também que tal circunstância decorria da garantia atribuída ao funcionário pela natureza do trabalho que prestava. Havia, portanto, relação direta entre a pensão devida pelo estado e a contribuição efetiva do funcionário em virtude do seu trabalho, ainda que se despreze o ângulo de sua participação como cidadão no pagamento dos impostos, dispensada uma contribuição específica. Por esse motivo, se ele assim cumpria a sua parte, fazia jus ao que estava integrado ao seu regime estatutário. Seria, portanto, uma contraprestação inerente ao seu regime jurídico, uma contraprestação implícita ao regime estatutário. Isso quer dizer que a pensão destinava-se a compensar o servidor público, na previdência aos seus dependentes, diante da natureza de seu trabalho. Como ele trabalhava sob regime especial, ou seja, o regime estatutário, ao seu trabalho correspondia também o pagamento de pensão. Com isso, a natureza e a origem da pensão não guardam nenhuma ligação com aquela do ato ilícito e, ainda, decorria da contraprestação do funcionário.

    Com essas razões, pedindo vênia aos eminentes Ministros Ari Pargendler e Nancy Andrighi, eu, como fez o eminente Relator, mantenho a pensão.

    Da mesma forma, acompanho o Relator no que concerne à culpa concorrente. É que a nossa jurisprudência não releva a irregularidade da carteira de motorista vencida ( REsp nº 180.501 ⁄SP, da minha relatoria, DJ de 6⁄12⁄99). Note-se que o princípio geral é o de que esse tema está sob a perspectiva da Súmula nº 7 da Corte ( REsp nº 619.203 ⁄DF, da minha relatoria, DJ de 20⁄3⁄06), sem que se afaste a possibilidade de, nos termos da base fática posta no julgado, relevar um aspecto capaz de conduzir ao reconhecimento da culpa concorrente. É que para a concorrência de culpas leva-se em consideração" a efetiva participação da vítima para que o evento danoso tenha ocorrido "(Comentário ao Novo Código Civil , Forense, coordenado por Sálvio de Figueiredo Teixeira, vol. XIII, 2004, pág. 368).

    Em conclusão, conheço do especial da segunda recorrente, em parte, e, nessa parte, dou provimento na extensão do voto do Relator. Não conheço do especial da primeira recorrente.

    CERTIDÃO DE JULGAMENTO

    TERCEIRA TURMA

    Número Registro: 2003⁄0190651-1 REsp 604758 ⁄ RS

    Números Origem: 1196453185 70003670809

    PAUTA: 01⁄09⁄2005 JULGADO: 10⁄08⁄2006

    Relator

    Exmo. Sr. Ministro HUMBERTO GOMES DE BARROS

    Presidente da Sessão

    Exmo. Sr. Ministro CASTRO FILHO

    Subprocurador-Geral da República

    Exmo. Sr. Dr. JOÃO PEDRO DE SABOIA BANDEIRA DE MELLO FILHO

    Secretária

    Bela. SOLANGE ROSA DOS SANTOS VELOSO

    AUTUAÇÃO

    RECORRENTE : PETROPAR S⁄A

    ADVOGADO : CARLOS ROBERTO KIRCHHOF E OUTROS

    RECORRENTE : MARIANE BEATRIZ SCHILLING LING

    ADVOGADOS : LUÍS RENATO FERREIRA DA SILVA E OUTROS

    ROBERTO PIERRI BERSCH E OUTRO

    RECORRIDO : CÉLIA FLEIG PALUDO E OUTROS

    ADVOGADOS : MARÇO ANTÔNIO BIRNFELD E OUTROS

    FLÁVIO PANCARO DA SILVA E OUTROS

    ASSUNTO: Civil - Responsabilidade Civil - Indenização - Acidente - Transporte Rodoviário ⁄ Trânsito - Dano Material c⁄c Moral

    CERTIDÃO

    Certifico que a egrégia TERCEIRA TURMA, ao apreciar o processo em epígrafe na sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:

    Prosseguindo no julgamento, após o voto-vista do Sr. Ministro Carlos Alberto Menezes Direito, acompanhando o voto do Sr. Ministro Relator, não conhecendo do recurso especial da Petropar S⁄A, e conhecendo do recurso especial de Mariane Beatriz Schilling Ling e dando-lhe parcial provimento, acrescentando novos fundamentos, e a ratificação do voto da Sra. Ministra Nancy Andrighi, pediu vista o Sr. Ministro Castro Filho.

    Brasília, 10 de agosto de 2006

    SOLANGE ROSA DOS SANTOS VELOSO

    Secretária

    RECURSO ESPECIAL Nº 604.758 - RS (2003⁄0190651-1)

    RELATOR : MINISTRO HUMBERTO GOMES DE BARROS

    RECORRENTE : PETROPAR S⁄A

    ADVOGADO : CARLOS ROBERTO KIRCHHOF E OUTROS

    RECORRENTE : MARIANE BEATRIZ SCHILLING LING

    ADVOGADOS : LUÍS RENATO FERREIRA DA SILVA E OUTROS

    ROBERTO PIERRI BERSCH E OUTRO

    RECORRIDO : CÉLIA FLEIG PALUDO E OUTROS

    ADVOGADOS : MARÇO ANTÔNIO BIRNFELD E OUTROS

    FLÁVIO PANCARO DA SILVA E OUTROS

    VOTO-VISTA

    O EXMO. SR. MINISTRO CASTRO FILHO: Trata-se de dois recursos especiais interpostos nos autos de ação indenizatória por danos materiais e morais decorrentes do falecimento do marido e pai dos autores e das graves lesões sofridas por sua esposa, que o acompanhava, em acidente de trânsito provocado pela segunda ré, Mariane Beatriz Schilling Ling, ao conduzir veículo de propriedade da Petropar S⁄A, também demandada.

    O emérito relator, Ministro Humberto Gomes de Barros, negou provimento ao especial da empresa e proveu o de Mariane Schilling"apenas para afastar a incidência dos juros compostos, em razão da ausência do trânsito em julgado da sentença penal condenatória", registrando, ainda, a inexistência de culpa concorrente e a possibilidade de cumulação da pensão previdenciária com aquela decorrente do ato ilícito, à consideração de possuírem natureza e origem diversas.

    Em voto-vista, a ilustre Ministra Nancy Andrighi afastou o pagamento da pensão por ato ilícito ao entendimento de que o dano material deve ser ressarcido considerando o desfalque do patrimônio do lesado, o que não ocorre no caso, porque a vítima era magistrado e já recebe a viúva pensão integral. Assim, o próprio Estado teria legitimidade ativa para cobrar regressivamente da responsável pela lesão o valor da pensão, assim como se admite com relação aos contratos de seguro. Daí que proveu o especial para afastar o pagamento da pensão mensal vitalícia correspondente a cinqüenta por cento dos vencimentos da vítima. Na esteira do voto do relator, considerou indevidos os juros compostos, mas dele dissentiu, por entender caracterizada a culpa concorrente, haja vista que o motorista vitimado dirigia com carteira de habilitação vencida.

    No voto-vista que se seguiu, embora não reconhecendo a existência de culpa concorrente, o douto Ministro Ari Pargendler também afastou o pagamento da pensão, destacando que"a indenização por danos materiais não tem função punitiva. Ainda que também esse não seja o propósito da indenização pelos danos morais, o autor do ilícito sofre o respectivo desembolso como uma punição", por isso, prosseguiu S. Exa.,"a indenização por danos materiais sem a existência de prejuízo seria, pior do que a dita impunidade, um verdadeiro contra-senso."

    Por sua vez, o culto Ministro Menezes Direito acompanhou o voto do relator, tanto para afastar a existência de culpa concorrente quanto para admitir a cobrança cumulativa das pensões, porquanto, na sua compreensão"o regime da previdência estatal era, antes do estabelecimento de seu caráter contributivo", o que se deu com a promulgação da Emenda Constitucional nº 20 ⁄98,"certo ou errado, coberto pela receita do estado, oriunda dos tributos cobrados em sua parte substantiva. Mas, é preciso considerar também que tal circunstância decorria da garantia atribuída ao funcionário pela natureza do trabalho que prestava. Havia, portanto, relação direta entre a pensão devida pelo estado e a contribuição efetiva do funcionário em razão do seu trabalho, ainda que se despreze o ângulo de sua participação como cidadão no pagamento dos impostos, dispensada uma contribuição específica. Por essa razão, se ele assim cumpria a sua parte, fazia jus ao que estava integrado ao regime estatutário. Isso quer dizer que a pensão destinava-se a compensar o servidor público, na previdência aos seus dependentes, diante da natureza de seu trabalho. Como ele trabalhava sob regime especial, ou seja, o regime estatutário, ao seu trabalho correspondia também o pagamento de pensão. Com isso, a natureza e a origem da pensão não guardam nenhuma ligação com aquela do ato ilícito e, ainda, decorria da contraprestação do funcionário."

    Pedi vista para melhor exame da matéria, especialmente no que diz respeito à questão da cumulação de pensões.

    Não obstante os argumentos desenvolvidos com erudição pelo relator e pelo Ministro Menezes Direito, acompanho, no ponto, a dissidência. Isso porque, em se tratando de danos materiais, penso que o ressarcimento deve devolver os beneficiários à situação anterior ao evento danoso, consideradas as condições em que viviam.

    Nesse passo, só entendo justificável a cumulação na hipótese em que o pensionamento civil, decorrente do ato ilícito, tenha por fim complementar o pensionamento previdenciário, a fim de evitar que os beneficiários sofram uma perda em relação ao quantum percebido pela vítima quando em vida, o que não se verifica no caso vertente. Com efeito, com a morte do marido, a viúva, ora recorrida, passou a receber a pensão previdenciária correspondente à integralidade dos vencimentos da magistratura, o que, em termos econômicos, representou para ela um ganho, se considerarmos que, em vida, no mínimo, 1⁄3 (um terço) da remuneração da vítima seria destinada às suas despesas pessoais.

    Feitas essas considerações, acompanho o ilustre relator quanto às demais questões enfrentadas, no que diz respeito à culpa concorrente, por considerar a carteira vencida infração meramente administrativa, mas dele divirjo, com o devido respeito, para acompanhar a dissidência inaugurada pela Ministra Nancy Andrighi, no que se refere à impossibilidade de cumulação das pensões, no caso em exame.

    É o voto.

    Ministro CASTRO FILHO

    CERTIDÃO DE JULGAMENTO

    TERCEIRA TURMA

    Número Registro: 2003⁄0190651-1 REsp 604758 ⁄ RS

    Números Origem: 1196453185 70003670809

    PAUTA: 01⁄09⁄2005 JULGADO: 17⁄10⁄2006

    Relator

    Exmo. Sr. Ministro HUMBERTO GOMES DE BARROS

    Relatora para Acórdão

    Exma. Sra. Ministra NANCY ANDRIGHI

    Presidente da Sessão

    Exmo. Sr. Ministro CASTRO FILHO

    Subprocurador-Geral da República

    Exmo. Sr. Dr. PEDRO HENRIQUE TÁVORA NIESS

    Secretária

    Bela. SOLANGE ROSA DOS SANTOS VELOSO

    AUTUAÇÃO

    RECORRENTE : PETROPAR S⁄A

    ADVOGADO : CARLOS ROBERTO KIRCHHOF E OUTROS

    RECORRENTE : MARIANE BEATRIZ SCHILLING LING

    ADVOGADOS : LUÍS RENATO FERREIRA DA SILVA E OUTROS

    ROBERTO PIERRI BERSCH E OUTRO

    RECORRIDO : CÉLIA FLEIG PALUDO E OUTROS

    ADVOGADOS : MARÇO ANTÔNIO BIRNFELD E OUTROS

    FLÁVIO PANCARO DA SILVA E OUTROS

    ASSUNTO: Civil - Responsabilidade Civil - Indenização - Acidente - Transporte Rodoviário ⁄ Trânsito - Dano Material c⁄c Moral

    CERTIDÃO

    Certifico que a egrégia TERCEIRA TURMA, ao apreciar o processo em epígrafe na sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:

    Prosseguindo no julgamento, após o voto-vista do Sr. Ministro Castro Filho, a Turma, por unanimidade, não conheceu do recurso especial da Petropar S⁄A, e, por maioria, conheceu e deu parcial provimento ao recurso especial de Mariane Beatriz Shilling Ling, nos termos do voto da Sra. Ministra Nancy Andrighi. Votaram com a Sra. Ministra Nancy Andrighi os Srs. Ministros Ari Pargendler e Castro Filho. Votaram vencidos os Srs. Ministros Humberto Gomes de Barros e Carlos Alberto Menezes Direito.

    Lavrará o acórdão a Sra. Ministra Nancy Andrighi.

    Brasília, 17 de outubro de 2006

    SOLANGE ROSA DOS SANTOS VELOSO

    Secretária

    Documento: 558514 Inteiro Teor do Acórdão - DJ: 18/12/2006"

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