Reconhecida união estável paralela ao casamento
"Uma pessoa pode manter duas
famílias concomitantemente"
O relacionamento mantido por um homem ao longo de 16 anos, embora ele fosse casado há mais de 30 anos, é a prova de que uma pessoa pode manter duas famílias, sendo possível manter uma união estável paralela ao casamento. A conclusão é do desembargador José Ataídes Siqueira Trindade, integrante da 8ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul.
Em julgamento realizado no dia 20 de julho, o magistrado relatou apelação em que foi mantido, de forma unânime, reconhecimento de união dúplice, conforme sentença da 1ª Vara de Família e Sucessões de Porto Alegre.
O homem, já falecido, tinha dois filhos com a esposa, de quem nunca se separou de fato, e duas filhas com a funcionária de uma lanchonete de sua propriedade, que morava no mesmo prédio do estabelecimento. Embora reconhecendo como excepcional a situação, o magistrado apontou diversos elementos que comprovam as vidas paralelas. Está-se diante de uma entidade familiar concomitante ao casamento, analisou o desembargador.
Eram mantidos dois endereços, mesmo para fins de correspondência oficial. Fotografias retratam convívio social e familiar com a companheira e a esposa. A autora da ação se responsabilizou por internação hospitalar do companheiro. A esposa e os filhos do casamento pagaram as despesas com funeral. Ambas recebem do INSS pensão por morte. As testemunhas do processo confirmam as duas teses.
O presente feito é a prova cabal de que uma pessoa pode manter duas famílias concomitantemente, e com as duas evidenciar affectio maritalis, parecendo até que algumas pessoas têm capacidade de se dividir entre tais famílias como se fosse duas pessoas, e não uma só, registrou o relator.
Divisão do patrimônio
O magistrado manifestou-se pelo acolhimento parcial do recurso, estabelecendo que com relação ao patrimônio adquirido durante a vigência da união estável, a companheira terá direito a 25% e os outros 25% ficam com a esposa.
Trindade reproduziu trecho de voto do desembargador Rui Portanova em outra apelação (proc. 70009786419), que menciona: reconhecida união dúplice ou paralela, por óbvio, não se pode mais conceber a divisão clássica de patrimônio pela metade entre duas. Na união dúplice do homem, por exemplo, não foram dois que construíram o patrimônio. Foram três: o homem, a esposa e a companheira.
Legislação
Conforme Trindade, o relacionamento que perdurou de 1980 a 1996, quando o homem veio a falecer - teve parte de sua vigência e seu término sob o abrigo da Constituição Federal de 1988, que elevou a união estável à condição de entidade familiar.
Além disso, começou e findou sob o comando do Código Civil de 1916 , não sendo atingido pela Lei nº 10.406 /02 , que instituiu o Novo Código Civil , não se podendo falar em reconhecimento do concubinato previsto em seu art. 1.727 . O que leva a examinar o presente feito com base no instituto da união estável reconhecido pela Constituição Federal de 1988.
De acordo
Ao votar no mesmo sentido, o desembargador Rui Portanova destacou que a decisão não passa por cima da lei, pois a primeira função do Juiz é olhar a realidade dos fatos.
Também o desembargador Claudir Fidélis Faccenda afirmou que os Juízes, como interpretadores da lei, têm sempre que se conduzir pelo mundo dos fatos. No caso, efetivamente houve o estabelecimento de duas famílias.
Proc. 70015076326
0 Comentários
Faça um comentário construtivo para esse documento.