Incide IR sobre a complementação de aposentadoria de previdência privada
STJ considerou que a incidência do imposto de renda se dá independentemente do período ou da legislação vigente à época do recolhimento das contribuições do beneficiário para o fundo de pensão.
Leia, abaixo, a íntegra da decisão:
Processo: REsp 658255
"RECURSO ESPECIAL Nº 658.255 - SE (2004 /0064737-7)
RECORRENTE : FAZENDA NACIONAL
PROCURADOR : GUSTAVO CÉSAR DE FIGUEIREDO PORTO E OUTROS
RECORRIDO : CARLOS ROBERTO ANTONIO MAIA E OUTROS
ADVOGADO : BENEDITO MELO DOS SANTOS E OUTROS
RELATÓRIO
A EXMA. SRA. MINISTRA ELIANA CALMON (Relator): - Trata-se de
recurso especial, interposto com fulcro na alínea a do permissivo constitucional, em face de
acórdão do Tribunal Regional Federal da 5ª Região, assim ementado:
TRIBUTÁRIO. IMPOSTO DE RENDA. COMPLEMENTAÇÃO DE
APOSENTADORIA. PREVIDÊNCIA PRIVADA. LEI 7.713 /88 E 9.250/95 . ÔNUS DA
CONTRIBUIÇÃO.
1. O exame da incidência do imposto de renda sobre os ganhos financeiros
da entidade previdenciária não é matéria de prova, mas , de Direito, podendo este julgador,
com elementos constantes dos autos, concluir se a referida entidade goza ou não de isenção
tributária.
2. A jurisprudência dominante do colendo Supremo Tribunal Federal não
reconhece a imunidade das entidades de previdência privada (Precedentes: RE n.º
136.332-1/RJ, DJ 25.06.93; RE n.º 146.747 -9/CE, DJ 24.09.99), não configurando a hipótese
da norma que somente isentava a renda dos participantes da entidade privada, se esta não
gozasse de idêntico benefício.
3. A petição inicial foi devidamente instruída com os documentos
comprobatórios do pagamento que o autor aduz indevido, pois evidenciam o efetivo
recolhimento, na fonte, do tributo em tela.
4. A isenção instruída no art. 6.º , da Lei n.º 7.713 /88 , sofreu restrição com o
advento da Lei n.º 9.250 /95 , daí porque o benefício somente apanha os valores relativos aos
seguros por morte ou invalidez. Fora destes casos, o imposto de renda incide sobre a
complementação dos proventos, a partir de 1996, mantendo-se a isenção, tão-semoente, sobre
as complementações de aposentarias recebidas até essa data.
5. Apelação e remessa oficial parcialmente providas.
(fls. 285)
Inconformada, a UNIÃO aponta violação ao art. 6ºº , VII , b , da Lei7.7133 /88 ,
sustentando que para isenção do Imposto de Renda, quanto a benefícios recebidos de entidade
de previdência privada, é necessário que os rendimentos e ganhos de capital produzidos pelo
patrimônio da entidade tenham sido tributados na fonte.
Sustenta, ainda, que não houve prova de que a tributação foi realizada e, com
fulcro art. 333 do CPC , atribui esse ônus aos autores, argumentando não bastar a simples
afirmação de que as entidades privadas não seriam imunes.
Após as contra-razões, subiram os autos, admitido o especial na origem.
É o relatório.
A informação disponível não será considerada para fins de contagem de prazos
recursais
(Ato nº 135 - Art. 6º e Ato nº 172 - Art. 5º)
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RECURSO ESPECIAL Nº 658.255 - SE (2004 /0064737-7)
RELATORA : MINISTRA ELIANA CALMON
RECORRENTE : FAZENDA NACIONAL
PROCURADOR : GUSTAVO CÉSAR DE FIGUEIREDO PORTO E OUTROS
RECORRIDO : CARLOS ROBERTO ANTONIO MAIA E OUTROS
ADVOGADO : BENEDITO MELO DOS SANTOS E OUTROS
VOTO
A EXMA. SRA. MINISTRA ELIANA CALMON (Relator): A questão
trazida nos autos refere-se à possibilidade de incidência de imposto de renda sobre a verbas
recebidas a título de complementação de aposentadoria de entidade de previdência privada.
A jurisprudência desta Corte firmou entendimento no sentido de que não
incide imposto de renda quando do recebimento da complementação de aposentadoria,
proporcionalmente ao montante recolhido, cujo ônus tenha sido do beneficiário, no período de
na vigência da Lei 7.713 /88 (1º/01/89 a 31/12/1995).
Assim também vinha decidindo, consoante se pode conferir da ementa a seguir
transcrita:
TRIBUTÁRIO - IMPOSTO DE RENDA - BENEFÍCIO -
COMPLEMENTAÇÃO DE APOSENTADORIA.
1. O fato gerador do Imposto de Renda é a aquisição de disponibilidade
econômica ou jurídica decorrente de acréscimo patrimonial (art. 43 do CTN), no qual se
incluem as verbas de natureza salarial ou as recebidas a título de aposentadoria.
2. O participante do plano de previdência privada tem direito ao benefício
contratado com a aposentadoria, permanecendo o vínculo jurídico com a entidade,
diferentemente do que ocorre quando a pessoa jurídica é extinta, dando ensejo ao resgate das
contribuições e/ou rateio do patrimônio.
3. Não deve haver nova incidência tributária no momento do recebimento da
complementação de aposentadoria, proporcionalmente ao montante recolhido, cujo ônus tenha
sido do beneficiário, no período de 1º/01/89 a 31/12/1995, ou seja, na vigência da Lei 7.713/88.
4. Recurso especial conhecido em parte e, nessa parte, improvido.
(RESP 608.189/RS , Rel. Ministra ELIANA CALMON, SEGUNDA TURMA, julgado em
03.06.2004, DJ 20.09.2004 p. 261).
Esse posicionamento decorre do seguinte raciocínio: se, na vigência da Lei 7.713/88 , incidiu o imposto de renda sobre a parcela salarial destinada ao fundo de
previdência complementar, no momento de sua devolução, na forma de complementação de
aposentadoria, não poderia haver nova incidência tributária, a fim de se evitar o bis in idem.
Contudo, reexaminando a matéria, passei a considerar aspectos que me
levaram a alterar o meu posicionamento. Explico.
As demandas relativas ao imposto de renda sobre valores advindos de fundos
de pensão desdobram-se em três hipóteses distintas: resgate, rateio e complementação de
aposentadoria.
O resgate e o rateio decorrem do desligamento do beneficiário do plano de
previdência privada. A diferença entre os dois é que, no rateio, o desligamento se dá como
conseqüência da extinção da entidade de previdência, de modo que todo o seu patrimônio é
distribuído entre os associados; no resgate, apenas é devolvido ao beneficiário o que foi por
ele recolhido ao fundo de pensão. Já no recebimento da aposentadoria complementar, o
vínculo contratual permanece e o direito do beneficiário existe exatamente em virtude do
cumprimento do contrato firmado.
Para fins de incidência de imposto de renda, as três situações ganham
contornos diferentes.
Quanto ao resgate, a visualização da questão é bem simples. No momento do
desligamento do beneficiário da entidade previdenciária, somente o que foi por ele recolhido
ao fundo é devolvido - com a devida remuneração do capital. Portanto, há uma perfeita
identidade daquilo que foi recolhido e do que será devolvido ou resgatado. Por exemplo, se
foram recolhidas 12 parcelas ao fundo, essas 12 parcelas serão resgatadas com os rendimentos
obtidos.
Nessa hipótese, para efeito de incidência de imposto de renda, deve-se
observar o seguinte: se houve incidência da exação no momento do recolhimento da parcela
em favor do fundo, não deve haver nova incidência quando do resgate, para se evitar o bis in
idem. Se não incidiu o imposto de renda no momento do recolhimento, o tributo deverá
incidir na parcela respectiva, por ocasião do resgate. Essa distinção decorre da sistemática
legal adotada.
Assim, quando do resgate, não deve incidir imposto de renda sobre os valores
recolhidos durante a vigência da Lei 7.713 /88 , porque, no período de sua vigência (1º/01/89 a
31/12/1995), ficou estabelecida a incidência do imposto de renda sobre os valores destinados
ao fundo de pensão.
Com a mudança dessa sistemática, a partir da Lei 9.250 /95, as parcelas
destinadas ao fundo passaram a ser isentas de imposto de renda; por isso, por ocasião do
resgate, incide o imposto de renda ( art. 33 ).
A fim de evitar-se a bitributação, o próprio Poder Executivo editou a Medida
Provisória nº 1.459/96 , sucessivamente reeditada, excluindo da incidência do imposto de
renda o valor do resgate de contribuições de previdência privada correspondentes à
contribuições efetuadas de 1º de janeiro de 1989 a 31 de dezembro de 1995, nos seguintes
termos:
Art. 6º Exclui-se da incidência do imposto de renda na fonte e na
declaração de rendimentos o valor do resgate de contribuição de previdência privada, cujo
ônus tenha sido da pessoa física, recebido por ocasião de seu desligamento do plano de
benefícios da entidade, que corresponder às parcelas de contribuições efetuadas no período de
1º de janeiro de 1989 a 31 de dezembro de 1995.
Observe-se que o que se alterou, na vigência de ambas as leis, foi a sistemática
de recolhimento porque, em qualquer caso há ocorrência do fato gerador do imposto de renda:
acréscimo patrimonial.
A hipótese de rateio se assemelha ao resgate. A diferença é que, além de o
participante" resgatar "aquilo que recolheu ao fundo, recebe também o valor referente ao
rateio do patrimônio da entidade liquidada, de modo que, da mesma forma, não incide o
imposto de renda sobre os valores" resgatados "cujo ônus tenha sido do beneficiário, se já
houve incidência sobre as parcelas destinadas à entidade de previdência (Lei 7.713 /88).
Sobre as demais parcelas recebidas, não relacionadas a valores transferidos ao
fundo pelo participante no período de vigência da Lei 7.713 /88, bem como sobre o montante
decorrente da liquidação do patrimônio da entidade distribuído aos beneficiários incide o
imposto de renda, pois, configura-se acréscimo patrimonial.
Nesses casos, pois, uma questão deve ficar bem clara: existe nítida correlação
entre a parcela recolhida pelo participante e aquela resgatada no momento do desligamento da
entidade de previdência.
Hipótese totalmente diversa é a da complementação de aposentadoria.
Nesse caso, o vínculo contratual entre o participante e a entidade de
previdência privada está em vigor e as parcelas pagas a título de complementação são
recebidas em virtude desse vínculo. Aliás, o fundo criado para pagamento da
complementação não se constitui apenas com o que foi desembolsado pelo beneficiário,
havendo, na maioria dos planos, parcela de contribuição do empregador, bem como
aplicações financeiras.
Não se trata, pois, de devolução, como no caso do resgate e rateio, de modo
que inexiste correlação entre o que foi recolhido e que foi recebido na aposentadoria.
Na adesão ao plano de previdência complementar, estipula-se o valor da
complementação, bem como o valor da contribuição mensal do participante, a fim de que ele
tenha direito de receber o quantum pretendido pelo beneficiário. Aparente equilíbrio entre o
valor da contribuição mensal e da complementação de proventos decorre, apenas, de cálculos
atuariais, que levam em conta fatores diversos e não apenas do montante da contribuição do
participante.
A inexistência de correlação entre a contribuição mensal e a complementação
da aposentadoria fica evidente quando observada a possibilidade de contratação de renda
mensal vitalícia - o que é feito na grande maioria dos casos -, prevista no art. 14, § 4º , e no
art. 33 , § 2º , da Lei Complementar 109 /2001 , que dispõe sobre o Regime de Previdência
Complementar (grifei):
Art. 14..........................
.....................................
§ 4º O instituto de que trata o inciso II deste artigo, quando efetuado para
entidade aberta, somente será admitido quando a integralidade dos recursos financeiros
correspondentes ao direito acumulado do participante for utilizada para a contratação de renda
mensal vitalícia ou por prazo determinado, cujo prazo mínimo não poderá ser inferior ao
período em que a respectiva reserva foi constituída, limitado ao mínimo de quinze anos,
observadas as normas estabelecidas pelo órgão regulador e fiscalizador.
.......................................
Art. 33.............................
........................................
§ 2º Para os assistidos de planos de benefícios na modalidade contribuição
definida que mantiveram esta característica durante a fase de percepção de renda programada,
o órgão regulador e fiscalizador poderá, em caráter excepcional, autorizar a transferência dos
recursos garantidores dos benefícios para entidade de previdência complementar ou
companhia seguradora autorizada a operar planos de previdência complementar, com o
objetivo específico de contratar plano de renda vitalícia, observadas as normas aplicáveis.
Se a complementação de aposentadoria é vitalícia, como se pode pretender
vislumbrar correspondência entre ela e a contribuição mensal? Ora, nesse caso, o beneficiário
pode receber valor muito maior do que aquele para o qual contribuiu, se sobreviver muitos
anos após a aposentadoria, ou muito menor, no caso de morte prematura, situação que pode
ser perfeitamente comparada, nesse ponto, com o contrato de seguro.
Portanto, impossível configurar-se a hipótese de bis in idem nesse caso pois, se
não há identidade entre a parcela recolhida e a recebida na complementação, inexiste
bitributação, não importando se a contribuição mensal foi recolhida sob a égide da Lei 7.713/88 ou na vigência da Lei 9.250 /95 .
A conclusão desse raciocínio leva ao seguinte desfecho: em caso de
recebimento de aposentadoria complementar é sempre legítima a incidência do imposto de
renda, pois há acréscimo no patrimônio do beneficiário, conforme previsto no art. 33 da Lei 9.250/95:
Art. 33. Sujeitam -se à incidência do Imposto sobre a Renda na fonte e na
declaração de ajuste anual os benefícios recebido de entidade de previdência privada, bem
como as importâncias correspondentes ao resgate de contribuições.
Pode-se fazer a seguinte pergunta: se é sempre devido o imposto de renda, por
que a lei, em determinados momentos, isentou do tributo o valor destinado ao fundo de
pensão e em outros não o fez? A resposta é muito simples: a isenção não consiste em
mecanismo de evitar a bitributação, mas, sim, em política fiscal, que visa à intervenção em
setores da economia nacional. In casu, o fato de não haver isenção fiscal no momento da
formação do patrimônio da entidade previdenciária não implica que necessariamente haverá
isenção em outro momento.
Desse modo, entendo de absoluta importância a reanálise da matéria sob o
ângulo acima exposto, pelo qual concluo que, nos termos do art. 33 da Lei 9.250 /95, incide
imposto de renda sobre as verbas recebidas a título de complementação de aposentadoria,
independentemente do período ou da legislação vigente à época do recolhimento das
contribuições do beneficiário para o fundo de pensão.
Com essas considerações, dou provimento ao recurso especial.
É o voto.
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