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19 de Abril de 2024
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    Justiça mantém proibida queima de palha de cana-de-açúcar em São Paulo

    Publicado por Expresso da Notícia
    há 15 anos

    A Segunda Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) manteve a decisão judicial que proibiu A proibição foi estabelecida no julgamento de uma ação civil pública proposta pelo Ministério Público estadual com o objetivo de proteger o meio ambiente e a saúde dos trabalhadores que fazem o corte da planta.

    Além de proibir a queima da cana-de-açúcar, a Justiça paulista condenou produtores a pagar indenização correspondente a 4.936 litros de álcool por cada alqueire eventualmente queimado. A decisão foi contestada em recurso interposto pelos produtores, mas o entendimento da primeira instância foi mantido pelo Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP).

    Descontentes com o resultado do julgamento, os produtores ingressaram com outro recurso no STJ alegando que a decisão violava o artigo 27 do Código Florestal Brasileiro (Lei nº 4.771/65). O dispositivo proíbe o uso de fogo em florestas e outras formas de vegetação, mas prevê uma exceção: autoriza o emprego de fogo se peculiaridades locais ou regionais justificarem tal prática em atividades agropastoris e florestais. Na última hipótese, a lei ressalva que deve haver permissão do Poder Público para a realização da queimada.

    Nas razões do recurso, os produtores fizeram uma interpretação extensiva do Código Florestal, argumentando que o artigo 27 abrangeria não somente as queimas relativas a atividades culturais de comunidades protegidas, mas também práticas comerciais organizadas e estruturadas para a produção de insumos em massa.

    Essas alegações não foram, no entanto, suficientes para convencer os ministros do STJ. Seguindo precedentes do tribunal e acolhendo os fundamentos do voto do relator do recurso, ministro Humberto Martins, os demais integrantes da Segunda Turma entenderam que, considerando a necessidade de o desenvolvimento ser sustentável, há hoje em dia instrumentos e tecnologias modernos que podem substituir a queimada sem inviabilizar a atividade econômica industrial.

    Em seu voto, o ministro relator explicou que a exceção prevista na lei (peculiaridades locais ou regionais) tem o objetivo de compatibilizar dois valores protegidos pela Constituição: o meio ambiente e a cultura, esta última compreendida como o “modo de fazer” de determinada comunidade. Assim, sustentou o ministro, a interpretação do dispositivo não pode abranger atividades agroindustriais ou agrícolas organizadas porque, quando há formas menos lesivas de exploração, o interesse econômico não pode prevalecer sobre a proteção ambiental.

    Para o relator, ao ressalvar as peculiaridades locais e regionais, a lei procura proteger de violações a cultura, o modo de vida e a forma de produção agrícola das comunidades. Entretanto, argumentou, não é a atividade industrial a destinatária da exceção legal, uma vez que o setor possui os instrumentos adequados para exploração da atividade agrícola sem causar grandes danos ao meio ambiente.

    Danos à saúde e ao meio ambiente

    Para fundamentar seu voto, o ministro Humberto Martins se valeu de informações de diversas ciências relacionadas à área ambiental. “A interpretação das normas que tutelam o meio ambiente não comporta apenas, e tão-somente, a utilização de instrumentos estritamente jurídicos”, observou ele. “As ciências relacionadas ao estudo do solo, ao estudo da vida, ao estudo da química, ao estudo da física devem auxiliar o jurista na sua atividade cotidiana de entender o fato lesivo ao Direito Ambiental.”

    Citando estudo de um engenheiro florestal do Paraná, o ministro ressaltou que a queima da palha da cana-de-açúcar é extremamente danosa à saúde e ao meio ambiente. A queimada consiste em atear fogo no canavial para destruir cerca de 30% da biomassa (folhas secas e verdes), que não interessam à indústria do açúcar e do álcool.

    A queima da palha libera gás carbônico e outros gases na atmosfera nocivos à saúde. Entre o coquetel de substâncias químicas liberados destacam-se os hidrocarbonetos aromáticos policíclicos (HAPs), componente altamente cancerígeno. Estudo realizado pela Universidade Estadual Paulista (UNESP) constatou um aumento de HPAs no organismo de cortadores de cana e no ar das imediações de canaviais durante a época de safra da planta. Na safra, quando cortam cana queimada, os trabalhadores ficam expostos à fumaça da queima.

    Informações dos autos também mostraram que as condições ambientais de trabalho do cortador de cana queimada são muito piores que as condições de corte da cana crua, pois a temperatura no canavial queimado chega a mais de 45ºC. Além disso, a fuligem do insumo penetra na corrente sanguínea do trabalhador por meio da respiração. Substâncias cancerígenas presentes na fuligem já foram identificadas na urina de cortadores.

    As queimadas também causam grande impacto sobre a fauna. Grande número de animais silvestres encontra abrigo e alimento em meio ao canavial, formando ali um nicho ecológico. Informações da polícia ambiental de São Paulo revelam que, após as queimadas nos canaviais, são encontrados muitos animais mortos, moribundos ou abalados pelo calor, fumaça e fogo.

    Processo nº REsp

    Leia, abaixo, a íntegra da decisão:

    "Superior Tribunal de Justiça

    EDcl no RECURSO ESPECIAL Nº 1.094.873 - SP (2008/0215494-3)

    RELATOR : MINISTRO HUMBERTO MARTINS

    EMBARGANTE : FILIPE SALLES OLIVEIRA E OUTRO

    ADVOGADO : MARCOS TADEU DE SOUZA E OUTRO (S)

    EMBARGADO : MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SÃO PAULO

    EMENTA

    PROCESSUAL CIVIL - EMBARGOS

    DECLARATÓRIOS NO RECURSO ESPECIAL -

    CONTROVÉRSIA SOBRE MÉRITO E QUESTÃO NÃO

    APRECIADA PALA CORTE DE ORIGEM - SÚMULA 211 DO STJ

    - CONTRADIÇÃO, OMISSÃO, OBSCURIDADE OU ERRO

    MATERIAL - INEXISTÊNCIA - EMBARGOS DE DECLARAÇÃO

    REJEITADOS.

    DECISÃO

    Vistos.

    Cuida-se de embargos de declaração em recurso especial opostos por

    FILIPE SALLES OLIVEIRA E OUTRO contra decisão da minha lavra assim ementada

    (fls. 2308/2317):

    "ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL - AÇÃO CIVIL

    PÚBLICA - ART. 27, PARÁGRAFO ÚNICO, DO CÓDIGO FLORESTAL - QUEIMADA DE PALHA DE CANA-DE-AÇÚCAR -

    ALEGAÇÃO DE VIOLAÇÃO DO ART. 535 DO CPC - AUSÊNCIA DE

    OMISSÃO, OBSCURIDADE OU CONTRADIÇÃO - DIVERGÊNCIA

    JURISPRUDENCIAL NÃO DEMONSTRADA, POR AUSÊNCIA DE

    COTEJO ANALÍTICO - PROIBIÇÃO DA QUEIMADA - RECURSO

    ESPECIAL CONHECIDO EM PARTE E IMPROVIDO."

    Alegam os embargantes que, entre"as várias matérias veiculadas no Recurso Especial, precisamente no ponto que ele foi conhecido, os embargantes invocaram que (i) no Estado de são Paulo a legislação estadual criou o chamado Plano de Eliminação de Queimada (PEQ), através do qual paulatinamente será reduzido o emprego de fogo como método preparatório da colheita; e, (ii) ainda que se admitisse ilícita essa prática, mesmo assim a decisão do tribunal paulista teria deixado de examinar 'o despropósito de fixar-se indenização de 4.936 litros de

    álcool por alqueire queimado "(fls. 2324/2325).

    O Ministério Público Federal apresentou manifestação pelo não-conhecimento dos embargos ou, acaso convertidos em agravo regimental, pela rejeição do recurso (fls. 2329/2331).

    É, no essencial, o relatório.

    Os embargantes, inconformados, buscam efeitos modificativos com a oposição destes embargos declaratórios, uma vez que pretendem ver reexaminada e decidida a controvérsia de acordo com sua tese.

    Em relação à sua primeira alegação de omissão, deve ficar claro que toca apenas e tão-somente o mérito da decisão que não pode, salvo casos excepcionais, ser debatido em sede de aclaratórios.

    Em relação à sua segunda alegação, os próprios embargantes afirmam que a decisão não foi apreciada pelo Tribunal Paulista, o que, conforme a Súmula 211 do STJ , impede o conhecimento da matéria.

    A omissão, a contradição e a obscuridade suscetíveis de serem afastadas por meio de embargos declaratórios são as contidas entre os próprios termos do dispositivo ou entre a fundamentação e a conclusão do acórdão embargado.

    Com a valoração da matéria debatida, houve tomada de posição contrária aos interesses da embargante. Ocorre que o recurso de embargos de declaração não tem a finalidade de confrontar julgados ou teses dissonantes e, por conseguinte, dirimir eventual divergência acerca da matéria em exame. Não é idôneo também para trazer à baila questão não citada nas razões de recurso especial, mesmo

    que tratada no acórdão da Corte de origem.

    A propósito:

    "PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DECLARATÓRIOS NO

    RECURSO ESPECIAL. CONTROVÉRSIA SOBRE A PRESCRIÇÃO.

    CONTRADIÇÃO, OMISSÃO E ERRO MATERIAL. INEXISTÊNCIA.

    REJEIÇÃO DOS EMBARGOS.

    1. De acordo com o art. 535 do Código de Processo Civil , os embargos declaratórios são cabíveis quando houver, na sentença ou no acórdão, obscuridade ou contradição, ou quando for omitido ponto sobre o qual se devia pronunciar o juiz ou tribunal.

    2. Na hipótese, sob a alegação genérica de que existiria contradição, erro material e omissão no acórdão embargado, a Procuradoria da Fazenda Nacional expõe, na verdade, o seu mero inconformismo com o resultado do julgamento do recurso especial.

    3. No apelo nobre, especificamente em relação à questão da prescrição, o autor da ação apontou, além de divergência jurisprudencial, contrariedade aos arts. 106, I, 150, § 4º, e 168, I, do Código Tributário Nacional, e 3º e da Lei Complementar 118/2005 .

    Dada a notoriedade do dissídio interpretativo, a controvérsia pôde ser bem compreendida, inclusive pela parte ré, tanto que, ao contra-arrazoar o recurso especial, a Procuradoria da Fazenda Nacional refutou, quanto ao mérito, a tese recursal do autor.

    4. No julgamento da Argüição de Inconstitucionalidade nos Embargos de Divergência no Recurso Especial 644.736/PE (Rel. Min. Teori Albino Zavascki, DJ de 27.8.2007), ao declarar a inconstitucionalidade da expressão “observado, quanto ao art. , o disposto no art. 106, inciso I, da Lei nº 5.172, de 25 de outubro de 1966 - Código Tributário Nacional ”, constante do art. , segunda parte, da Lei Complementar 118/2005 , a Corte Especial ressalvou:

    "(...) com o advento da LC 118/05 , a prescrição, do ponto de vista prático, deve ser contada da seguinte forma: relativamente aos pagamentos efetuados a partir da sua vigência (que ocorreu em 09.06.05), o prazo para a ação de repetição do indébito é de cinco a contar da data do pagamento; e relativamente aos pagamentos anteriores, a prescrição obedece ao regime previsto no sistema anterior, limitada, porém, ao prazo máximo de cinco anos a contar da vigência da lei nova." 5. Portanto, são descabidos os presentes embargos, haja vista que sua real intenção não é sanar algum vício no acórdão embargado, e sim rediscutir o julgado, buscando efeitos infringentes, o que não é viável em razão dos rígidos contornos

    processuais desta espécie de recurso.

    6. Embargos declaratórios rejeitados."

    (EDcl no REsp 1.023.695/RS , Rel. Ministra Denise Arruda, Primeira Turma, julgado em 16.9.2008, DJ. 6.10.2008.)

    Assim, não resta dúvida de que os embargos declaratórios somente são cabíveis para a modificação do julgado que se apresenta omisso, contraditório ou obscuro, bem como para sanar possível erro material existente na decisão, na forma do disposto no artigo5355 doCódigo de Processo Civill .

    Ante o exposto, rejeito os presentes embargos de declaração.

    Publique-se. Intimem-se.

    Brasília (DF), 30 de março de 2009.

    MINISTRO HUMBERTO MARTINS

    Relator"

    Documento: 4958480 - Despacho / Decisão - Site certificado - DJ: 23/04/2009

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